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07 novembro 2007

Trabalho sobre o dadaísmo

MARIA ELZA LAGO DE MELO


 


 


 


 


 


 


 

DADAÍSMO: O CAOS DA ARTE


 


 


 


 


 


 

Trabalho de bacharelado apresentado em pintura, curso de Artes, do Instituto de Ciências Exatas, Universidade Federal de Juiz de Fora.

Prof. Ricardo Cristofaro


 


 


 


 


 


 

JUIZ DE FORA

2000

 

SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO 3

2- A GUERRA INICIANDO A ANTIARTE 5

2.1- Cabaret Voltaire a Essência Dada 8

2.2- O Movimento Dadaísta Movimentando o Cabaret 10

2.3- Dada... Dadá... Da, Da...? 12

2.4- Dadaísmo Niilista Anárquico 13

2.5- Dada Agitando Zurique 14

2.6- O Acaso em Dada 16

2.7- Kurt Schwitters; Dada em Hanôver 19

2.8- Max Ernst: Dada em Colônia 21

2.9- Tristan Tzara: Dada em Paris 24

2.10- Huelsenbeck, Hausmann: Dada em Berlim 26

2.11- Picabia, Duchamp, Man Ray: Dada em Nova York 28

.

3- DADA MOVIMENTANDO NOVOS MOVIMENTOS 31

3.1- Influências Dada inspirando os Neo Dada 33

3.2- Dada Fluxus Dada 35

3.3- A Antiarte da Arte Autodestrutiva 37

3.4- Dada e os Neo Dada 38


 

4- O CONTEMPORÂNEO E DADA 40


 

5- CONCLUSÃO 48


 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 50


 

ANEXOS 53


 

1- INTRODUÇÃO


 

Em nosso momento, o artista é solitário, não existem grupos, nem movimentos para estimular a criação artística. O artista é cobrado o tempo todo, tendo quase que a obrigação de fazer algo diferente do que já foi feito ou visto, algo chocante, inovador. Estamos num momento limítrofe da arte contemporânea?

Com o espírito Dadaísta, os artistas do início deste século, souberam como renovar a linguagem da Arte contemporânea. Hoje apesar de toda mudança histórico-cultural, o Dadaísmo continua atual, sendo o movimento que mais "estimulou" os artistas, principalmente na segunda metade deste 1900.

O Dadaísmo será o tema central deste trabalho, por ser um movimento de grande importância para a compreensão da Arte neste século. Polêmico, sacudiu os padrões da Arte e desestruturou todo pensamento de uma geração anteriormente impregnada por ideais e regras artísticas.

Como base da pesquisa será utilizado o livro Dada: Arte e Antiarte, de Hans Richter, editado pela Martins Fontes. A maioria dos estudos sobre Dada utilizam-no como referência, fazendo-nos crer que, talvez, de todos os artistas Dadaístas, Richter tenha sido o que melhor expressou, através das palavras, o que venha a ser o Dadaísmo.

Para analisar o tema, a pesquisa será dividida em três partes a saber: a primeira, procurará refletir como a Primeira Guerra Mundial motivou o início do movimento e como os artistas rejeitaram a pintura tradicional, na busca de uma nova liberdade de expressão. Veremos, ainda nessa sessão, o Cabaret Voltaire, como essência Dada, onde, a princípio, aconteciam as manifestações artísticas, o início da "era" Dada, não como o começo de uma nova Arte, mas sim de uma aversão à vigente sem criatividade que levou à necessidade de surgimento de algo que se rebelasse contra as situações da época.

Argumentar-se á também, sobre as diversas interpretações acerca da escolha do nome Dada, do niilismo anárquico que pairava sobre os Dadaístas, do acaso em Dada, da voz do inconsciente, da alma.

Na parte final desta primeira etapa, será analisado o movimento nas cidades onde ele mais se destacou, como Hannover, Berlim, Zurique, Paris, Nova York e Colônia.

A segunda parte usará a leitura das correntes vanguardistas tidas como "pós-modernas", cujos ideais tiveram influências diretas do Dada tais como o movimento Fluxus, a Pop Art, os Novos Realistas, a Arte Autodestrutiva.

Na terceira e última parte, será transcrita uma entrevista realizada com Marcel Duchamp, um pouco antes de sua morte, e com o crítico de Arte John Perreaut, onde ambos conversam a respeito das obras de Duchamp.

O trabalho terminará com um paralelo entre a arte Dadaísta, e o que acontece em nosso tempo, com reflexões sobre a exposição "Sensation", sobre a performance de Vito Acconci, e a morte como tema em um dos trabalhos de Flávio de Carvalho.


 

2- A GUERRA INICIANDO A ANTIARTE


 

"A finalidade da arte é dar corpo à essência secreta das coisas, não copiar sua aparência."

Aristóteles


 

Um dos fatos mais importantes que contribuíram para as transformações artísticas no início deste século foi a Primeira Guerra Mundial. Vidas e trabalhos foram modificados por esta fase negra da História e isso, sem dúvida, não poderia deixar de interferir nos artistas que viviam nesta época.

A Primeira Guerra Mundial determinou uma corrida imperialista no século XX. A França e a Inglaterra, países que primeiro se industrializaram, lançaram-se primordialmente à corrida colonial e estabeleceram sua supremacia no mercado mundial. Já a Alemanha, o Japão e a Itália, que se industrializaram tardiamente, chegaram atrasados à corrida colonial, quando a divisão de mercado estava praticamente concluída.

Em uma análise superficial, podemos dizer que a Primeira Guerra Mundial foi a luta entre a Maior Potência (Inglaterra) e a candidata à maior potência (Alemanha), sendo as demais nações européias apenas coadjuvantes.

Mas foram os Estados Unidos que, "correndo por fora", tornaram-se a principal potência mundial, emprestando capital e vendendo armas e manufaturados para a Inglaterra, França e Rússia. Durante essa época, houve um grande interesse, por parte de alguns artistas europeus, em se refugiarem naquele país antes, durante e após a Guerra, construindo, assim, um novo momento na História da Arte: os Estados Unidos dominando a Arte e o mundo.

Os artistas da época passaram a rejeitar a pintura tradicional, tida como acadêmica ou impressionista, buscando, com isto, uma liberdade de expressão nunca tentada antes. Para realizar seus propósitos, visavam a absorver as representações do subconsciente, da Metafísica, da velocidade e das emoções violentas.

Nas primeiras duas décadas do século XX, diferentes movimentos despontaram no cenário artístico, abarcando artistas múltiplos, atraídos pelo gosto da experimentação de novos conceitos estéticos e de novas linguagens, destacando-se, neste período, o Cubismo e Futurismo.

O Cubismo, fundado por Picasso e Braque em 1907, foi muito influente na Arte Moderna, sendo apontado como um dos grandes momentos de mutação da arte ocidental. É caracterizado pelo bidimensionalismo, pela interpenetração dos planos e pelo simultaneísmo da visão.

Picasso e Braque, rompendo radicalmente com a idéia de arte como imitação da natureza, desprezaram as noções tradicionais de perspectiva, escorço e modelagem. Na medida em que representavam objetos reais, procuravam figurá-los tal como eram conhecidos, podendo assim, apreciar, simultaneamente, os múltiplos aspectos do objeto.

Na fase analítica do cubismo, as formas eram analisadas e transformadas em estruturas predominantemente geométricas, enquanto a cor quase desaparecia, tornando o quadro monocromático.

Na fase sintética, a cor tornou-se mais forte e as formas mais decorativas, sendo introduzidas nas pinturas, letras, palavras inteiras e fragmentos de jornais.

Pode-se dizer que o cubismo criou uma nova dimensão na Arte, recorrendo à pintura de memória, dando a certeza de que o pintor convencional pinta o que vê, enquanto o cubista pinta o que sabe estar lá.

O Futurismo começou em 1909, como movimento literário, quando o poeta italiano Fillipo Marinetti lançou seu manifesto, desafiando os artistas a mostrarem "coragem, audácia e revolta", para comemorar uma nova beleza: a beleza da velocidade.

A chave da arte Futurista era o próprio movimento: combinava cores fortes dos fovistas, com planos fraturados do Cubismo, para expressar propulsão.

A arte futurista foi bem recebida pela crítica, mas as demonstrações de seus adeptos causaram grandes transtornos ao público.

Os futuristas não desejavam um público passivo e, assim, faziam demonstrações em torres de igrejas, como a de San Marco, em Veneza, e gritavam "slogans" como: "Queimem os museus! Sequem os canais de Veneza! Queimem as gôndolas! Matem o luar!".

Recebiam, em troca de tanto esforço pela não passividade, frutas podre e restos de comida que a multidão jogava indignada.

Decididos a quebrar tradições, os futuristas se metiam também em outros assuntos, como a culinária, dando receitas, juntando ingredientes que jamais poderiam ser combinados tais como molho de chocolate com pistache, pimenta vermelha com água de colônia: Buon Appetito!

Os artistas mais engajados no movimento foram Marinetti e Boccioni. Este era considerado um líder e após sua morte, num acidente aos 34 anos, enquanto cavalgava, o movimento declinou rapidamente.

O Futurismo teve como tarefa histórica, preencher a lacuna deixada pelo romantismo e inserir a arte moderna Italiana na situação cultural Européia.

Como os cubistas, os futuristas desejavam exprimir uma sensibilidade moldada na vida atual. Mas, contrariamente aos cubistas, afastaram o mundo objetivo das formas e aproveitaram apenas o subjetivo dos rítmos da vida.

Procuravam apenas sugerir a intensidade violenta com a qual sensações, idéias, imagens, momentos se sucedem e se misturam em nós.

Durante esse período de grande atividades artísticas, o movimento que mais se destacou pela sua provocação e coragem foi o Dadaísmo.

Na primeira grande guerra, com início em 1914, milhares de pessoas morriam diariamente nas trincheiras, dez milhões foram massacradas ou ficaram inválidas.

Como revolta a tudo isso, surgiu o Dadaísmo, fundado na neutra cidade de Zurique, anunciando seu "slogan" sobre o que seria esse movimento "a guerra para acabar com todas as guerras". Sua contribuição foi fazer a arte menos um exercício e mais uma inclusão do imprevisível.

A guerra utilizou o mesmo "slogan", deixando-nos a dúvida: os Dada apropriaram-se da frase espontaneamente ou algum equívoco de interpretação destinou-lhe a feitura da frase?

Provavelmente este "slogan" tenha sido da Guerra, já que justificavam-na dizendo que depois dela, jamais haveria outras, esta seria a guerra para acabar com todas as Guerras.


 


 


 

2.1- Cabaret Voltaire: a essência Dada


 

Durante a Primeira Guerra Mundial, a cidade de Zurique, na Suíça, tornou-se um lugar onde refugiados europeus se protegiam. Ali se abrigaram desertores, emigrados, políticos, agentes secretos, negociantes não muito respeitáveis e, também, vários artistas, intelectuais, letrados e poetas de diferentes nacionalidades, formando-se o palco ideal para as manifestações contra a guerra, o jingoísmo e as tradições antiquadas. Naquele tempo, na mesma Zurique, Lenin e seus amigos iniciaram os planos para a revolução Russa.

Viveram em Zurique poetas pacifistas como Schickele, Leonard Frank e Franz Werfel. E um grupo especial de artistas formado por Hugo Ball, Emmy Henning (poetas alemães), Jean (Hans) Arp (pintor alsaciano), e ainda Tristan Tzara e Marcel Janco, nascidos na Romênia.

Hugo Ball pensava em abrir um lugar para entretenimento que fosse barato, em que se tocasse música e em que houvesse alguns atores para alegrar o público.

No início de 1916, alugou um corredor vazio que pertencia a Ephrain Jan, um ancião da marinha holandesa. Neste lugar, Hugo Ball e sua esposa Emmy Henning planejavam abrir seu próprio cabaré, com a intenção de criar um clube de artistas, um bar, um espaço para exposições e teatro.

Assim no dia 5 de fevereiro de 1916, foi aberto o cabaré Voltaire, cujo nome homenageava o grande filósofo francês, nascido em 1694, aclamado como o maior defensor do Iluminismo e como o orador da liberdade e da tolerância mais corajoso de sua geração.

O brilho de Voltaire como filósofo não se equipara à sua eminência como homem das Letras, poeta e dramaturgo, mas seu reconhecimento mundial foi mesmo através da filosofia.

As manifestações artísticas que ocorriam naquele lugar consistiam em propostas artísticas estranhas para a época, talvez até nunca vistas antes: música barulhenta, poemas simultaneamente recitados por 4 a 7 pessoas, danças estranhas, com pessoas de máscaras grotescas e fantasias bem feitas, interrompidas por leituras em alemão, versos em francês, sem sentido, sem encanto, totalmente desconexos.

Nas paredes do cabaré, foram pendurados quadros de artistas conhecidos e desconhecidos como: Arp, Paolo Buzzi, Cangiullo, Janco, Kisling, Marinetti, Modigliani, Mopp, Picasso, Van Rees, Slodki, Segal Wabel e outros.

No dia 15 de maio de 1916, Ball publicou um folheto que se intitulou Cabaré Voltaire, onde explica como surgiu o cabaré:


 

Quando eu fundei o Cabaré Voltaire, eu era da opinião que deveria haver algumas pessoas jovens, na Suíça, que não fossem tão estressadas como eu ou mesmo que fossem estressadas, que desfrutassem da sua independência e que desejassem proclamar isso. Eu fui ao senhor Ephrain, o dono do restaurante de Meierei e disse: "Por favor, senhor Ephrain, me deixe ter seu corredor. Eu quero abrir um cabaré". O senhor Ephrain concordou. Assim procurei alguns amigos e lhes perguntei se tinham um quadro, um desenho, uma gravura para exibir no cabaré. Fui então a imprensa amigável de Zurique e pedi para que escrevessem algumas notas, pois o cabaré será internacional e queremos fazer algumas coisas bonitas. Meus amigos me deram os quadros e a imprensa amigável escreveu as notas. Assim no dia 5 de fevereiro, abrimos nosso cabaré numa festividade bastante movimentada.

A senhora Henning e a senhora Leconte cantaram músicas em francês e canções dinamarquesas. Tristan Tzara recitou versos de Roumanian. Canções e danças populares da Rússia foram um encanto. Recebi muito apoio e congratulações do senhor Slodki que projetou o cartaz para o cabaré; e de Hans Arp que colocou a minha disposição alguns trabalhos de Picasso, além de seus próprios trabalhos, me prestigiando com alguns quadros de um amigo seu: o van Rees e Arthur Segal.

Organizamos um sarau russo e em seguida um francês com trabalhos de Apollinaire, Max Jacob, André Salmon, A. Jarry, Laforgue e Rimbaud.

No dia 26 de fevereiro e no dia 30 de março, nós executamos uma fabulosa performance intitulada Música de Negro, sempre com tambor grande, Bum! Bum! Bum! Laban estava presente à entusiástica performance, bastante entusiasmado. Isso graças a iniciativa de Tristan Tzara, Uelsenberck e Janco, que executaram pela primeira vez em Zurique e, simultaneamente, no mundo inteiro, versos de Messrs, Henri Barzun e Fernand Divoire, como também poemas simultâneo de suas próprias autorias. Para o pequeno folheto que nós estamos publicando hoje, nós temos que agradecer nossa própria iniciativa e a ajuda de nossos amigos dentro da França, Itália e Rússia. Esses exemplos de atividades aqui demonstradas e o interesse do cabaré é lembrar ao mundo dessa guerra de várias pátrias e mostrar a independência desses poucos espíritos, para os que vivem com outros ideais. A próxima meta dos artistas aqui reunidos é publicar um periódico internacional. Isso sairá de Zurique e será chamado DADA DADA DADA DADA DADA.


 

Nesta declaração foi documentado o nome "Dada" pela primeira vez e, de Zurique, foi levado ao mundo.

Em 14 de julho de 1916, o primeiro sarau Dada aconteceu no "Corredor Waage" e no mesmo mês começou a aparecer a série de livros "Coleção Dada".

Tzara escreve A Primeira Aventura Divina do Senhor Febrifuge, que se tornou o primeiro livro publicado e foi ilustrado por Marcel Janco. Logo após, outros livros também foram editados, como as orações Fantásticas de Huelsenbeck e Schalaben, Schalomai, Schalamezomai e os 25 poemas de Tzara, todos ilustrados por Arp.

No dia 17 de março de 1917, foi inaugurada a "Galeria Dada", na rua Bahnhofstrasse, número 19.As atividades foram transferidas do Cabaré para esse espaço Dada e, entre vários acontecimentos, estava a performance de KoKoschka chamada "Sphinx and Man-of-Straw", uma exibição inspirada tanto na arte que eles consideravam "velha" quanto na arte Moderna.

De julho de 1917 a maio de 1919, foram publicadas 4 edições do periódico Dada, tendo Tzara como editor.

Em fevereiro de 1919, Picabia publicou o oitavo número do periódico Vagabundo 391, com a colaboração dos dadaístas de Zurique.

Em outubro de 1919, aconteceu a publicação do último Dada de Zurique Der Zeltweg, editado por Otto Flake, Walter Serner e Tristan Tzara. Depois que as fronteiras entre os países da Europa foram de novo abertas, conecções com Berlim, Colônia e Paris foram restabelecidas. Huelsenbeck fundou um grupo Dada em Berlim. Arp e Max Ernst fundaram um em Colônia.

Com a iniciativa de Tzara, um grupo particularmente ativo explodiu em Paris. Dada se estendeu para a Holanda (Van Doesburg), e Schwitters fundou "Merz", a própria versão do Dada em Hannover. Esse nome do Dada em Hannover o qual não tenha um significado próprio; Schwitters colocou o significado que lhe interessara, o qual poderia ser mudado, se lhe conviesse.

A influência de Dada estendeu-se para países, capitais e cidades européias, bem como para as Américas do Norte e do Sul. Atingiu, assim a Itália, a Checoslováquia, a Iugoslávia, a Espanha, a Rússia, a Holanda, a Polônia entre os países, Genebra, Colônia, Barcelona entre as cidades e capital européia, chegou aos Estados Unidos, na América do Norte e, por fim, na América do Sul.


 

2.2- O movimento Dadaísta no Cabaré


 

Embora ainda sem nome definido, a idéia do Movimento Dadaísta, oficialmente fundado em 1916, já existia desde 1913, embora não tivesse um nome definido.

Essa história é ainda mais antiga do que se pensa: Richter, faz referência a um personagem da antigüidade, Hirostrato, que ateou fogo ao templo de Artemis em Éfeso, a fim de sacudir os seus concidadãos e chamar a atenção sobre si próprio. Afirma que essa atitude já era Dadaísta, pois tinha a mesma intenção, o desejo de chamar a atenção para sua própria pessoa e o movimento.

Se aceitarmos este fato como verdadeiro, poderemos acreditar que, ao longo de toda a História, sempre ocorreram atitudes dadaístas, a exemplo dos manifestos futuristas, parecidos com Dada, na concepção inicial.

Tzara era grande amigo de Marinetti, o que proporcionou um entrosamento entre Dada e o movimento futurista, através das correspondências que mantinham. Mesmo Marinetti sendo realista, ao que os dadaístas se opunham, estes absorveram o "barulhismo" ou música do barulho dos futuristas. Marinetti e seu grupo contrariamente aos dadaístas, amavam a guerra.

Em sua essência, o Dadaísmo é anárquico, valoriza a antiarte, é contra os padrões burgueses e a guerra, rejeita a arte tradicional.

Desejavam criar, através da antiarte, uma revolução jamais vista, dentro da Arte. Protestavam contra tudo o que existia na Arte até então, em especial a tinta a óleo; pois lhes parecia carregada com o peso da tradição e a tinta a óleo estava vinculada à exaltação que o homem fazia de si mesmo.

A principal meta dadaísta é acordar a imaginação, porque, para os dadaístas, o que estava sendo feito na Arte naquele período, era desinteressante, sem criatividade. A estratégia Dada era então, denunciar e escandalizar.

Dada pode ser qualquer coisa: um acontecimento, um estado de espírito, um poema, uma atitude e, segundo eles, todos somos Dada sem saber.

O início do movimento não foi considerado pelos dadaístas como o começo de uma nova Arte, mas de uma aversão:


 

Aversão à magnificência dos filósofos que durante três mil anos nos vêm explicando tudo (para quê?). Aversão as pretensões desses artistas - representantes - de – deus - na – terra, aversão à paixão e à maldade patológica real onde ela não merecia qualquer preocupação: aversão à falsa forma de dominação do homem, aversão a todas as categorias catalogadas, aos falsos profetas que são apenas uma fachada dos interesses financeiros, orgulho, doença, aversão aos representantes da arte mercantil feita de encomenda de acordo com umas leis infantis, aversão ao divórcio entre o bem e o mal, entre o belo e o feio (por que é mais valioso ser vermelho e não verde?). Aversão, finalmente, à dialética jesuítica, que pode explicar tudo e encher a cabeça das pessoas de idéias oblíquas e obtusas sem qualquer base filosófica ou étnica, tudo isso por meio de artifícios obscurecedores e ignóbeis
promessas de charlatões.


 

À medida que o Dada avançava, ele destruía continuamente , não por extensão, mas para si mesmo. Partindo de todas aversões citadas, ele não tirava nem conclusões nem vantagens e nem se orgulhava delas. Parou inclusive de combater o que quer que fosse, compreendendo a inutilidade de fazê-lo, pois nada daquilo tinha importância. O que interessava ao Dadaísta era seu próprio modo de vida.

A princípio, as atividades do Cabaré tinham motivos puramente artísticos, mas, no seguimento das atividades, surgiu o ponto focal da "novíssima arte".

Quando Dada foi inaugurado no Cabaré Voltaire, acreditavam que a Guerra havia sido provocada pelos vários governos pelas razões mais autocráticas, mais sórdidas e mais materialistas.

Hugo Ball recusou-se a servir à guerra, dizendo fazê-lo por motivos de consciência. Richard Huelsenbeck tinha escapado, por um fio, da perseguição dos beleguins da polícia que, visando aos chamados "objetivos patrióticos", amontoavam homens nas trincheiras do norte da França e davam-lhes obuses para comer. Achavam eles que não tinham a coragem necessária para morrer pela idéia de uma nação que era na melhor das hipóteses, um cartel de comerciantes de peles e aproveitadores do couro e, na pior, uma associação cultural de psicopatas os quais, como os alemães, partiram para a guerra com um volume de Goethe na mochila, para espantar os franceses e russos.


 

2.3- Dada... Dadá... Da, Da...?


 

O uso da palavra dada para designar o movimento foi enfocada por vários autores.

Alguns citam Hugo Ball e Richard Huelsenbeck, ao folhearem um dicionário alemão - francês, procurando um nome para Madame Le Roy, a cantora do cabaré, encontraram o termo francês Dada que significa cavalo de pau.

Já Richter diz que "não é possível constatar nem quem inventou a palavra Dada nem o seu significado, pois, segundo afirmava: "quando cheguei a Zurique em meados de agosto de 1916, ela já existia, e ninguém se preocupava em saber quem a achara, ou como ela se impusera".

Tzara e Janco confirmavam que "da, da", seriam, supostamente, falas romenas, exemplificando que, nesta língua, significam "sim, sim".

Em 18 de abril de1916, com o movimento ainda no início, Tzara deu esta versão: "Uma palavra nasceu, não sei como".

A verdade é que quando o movimento firmou-se, todos queriam para si o privilégio da autoria do nome.

Alguns afirmam que teria sido, pois fincado, num dicionário alemão – francês um punhal, cuja ponta teria posto em evidência a palavra Dada, que significa cavalinho de pau, em Francês, como já foi dito.

É curioso perceber, pois que são diversos os significados da expressão dada: cavalo de madeira, ama de leite, uma dupla afirmação (sim, sim), seja em russo, romeno; em determinadas regiões da Itália, os dados e a mãe são chamados de dada, os negros da tribo Kru, na África, chamam de dada ao rabo de uma vaca sagrada.

No Brasil, Dadá é um personagem da tradição afro-brasileira. Deus dos vegetais e da reprodução natural, filho de Iemanjá e Orugã. Representado por uma cabeça enfeitada de búzios brancos.

O que se destaca, enfim é que no dia 15 de junho a palavra apareceu impressa pela primeira vez no Cabaré Voltaire, quando se confirmou: "Dada é a origem primeva de toda arte. Dada preconiza a 'ausência do sentido' da arte, o que não significa, de modo algum, que ela faça sentido. Dada não tem sentido, como a natureza". Dada é apenas um símbolo de revolta e negação.


 

2.4- Dadaísmo niilista anárquico


 

O Dadaísmo, enquanto movimento, oscilava entre o niilismo
e a anarquia. Esta, originada no termo grego "anarkhos", que significa "sem governo", afirma que tudo o que limita a liberdade do homem deve ser suprimido.

Como movimento político e social, a anarquia pretende destruir os "freios"- Religião, Estado, Propriedade privada, Lei - que, segundo suas próprias teorias, dos freios, interpõem o indivíduo à sua liberdade para assim, possibilitar a construção de uma vida livre e solitária.

O niilismo, do latim "nihil" (nada), é uma doutrina filosófica e política baseada tanto na negação (seja da ordem social estabelecida, seja de todas as formas do esteticismo), quando na defesa do utilitário e do raciocínio científico.

Assim, utilizando técnicas revolucionárias, suas idéias (dos dadaístas), derivadas da tradição romântica, baseavam-se no apelo ao subconsciente, nos trabalhos ao acaso, e na crença da bondade intrínseca do homem quando não corrompido pela sociedade.


Em se propondo uma atuação interdiciplinar como única maneira possível de renovar a linguagem criativa, os artistas e poetas trabalhavam juntos. Assim podiam, todos, vivenciar em vários campos ao mesmo tempo ou trocando técnicas ou combinando-as e inventando formas diferentes de poesia, rompendo não somente com as formas da arte, mas, também, com o conceito das questões artísticas, considerando qualquer expressão humana, inclusive a involuntária, elevando-a à categoria de obra de Arte.

Os dadaístas romperam não somente com as formas da arte, mas também com o conceito da própria arte, questionando não só os princípios estéticos, como fizeram expressionistas ou cubistas, mas também o próprio núcleo da questão artística.

Dada daria à Verdade um impulso novo. Seria um ponto de convergência das energias abstratas e um trampolim para os grandes movimentos artísticos. Efêmera, mas eficaz, a Arte dadaísta preparou o terreno para movimentos vanguardistas tão importantes como o Surrealismo, a Arte Pop, a Performance, o Novo Realismo, o Minimalismo, dentre outros.

Como o niilismo, os Dada negavam tudo o que se fundamentava na tradição e na autoridade: expressa, pois, uma proposta niilista e anárquica.

Como os anarquistas, o Dada valorizava a liberdade do ser humano, destruía tudo o que não tivesse a Verdade como prioridade e produzia suas próprias leis.

O Dadaísmo abrangia todos os gêneros artísticos, desde que fossem revolucionários e contra a Arte convencional, expressava.


 

2.5- Dada agitando Zurique


 

O cabaré Voltaire proporcionava, sem dúvida, uma alegria que contagiava a todos os seus freqüentadores. Os poemas simultâneos, o barulhismos, a poesia automática, faziam um sucesso incrível. Os autores da poesia automática afirmavam que a poesia nasce diretamente das entranhas do poeta e que nada deve impedir que seja deste modo; os poemas são como a natureza, porque cada partícula é tão bela e importante quanto uma estrela; os homens é que se julgam no direito de determinar o que é belo e o que é feio. É importante ressaltar, quanto a este tipo de poesia, que mais tarde, os surrealistas se apoderaram dele, destinando-lhe tal nome: poesia automática.

Com o crescimento das atividades do Dada diversificando os
espetáculos, incluindo exposições, conferências, leituras, danças ao lado de quadros, visando unir as artes, o movimento acabou se transformando numa Arte total.

A burguesia via o Dadaísmo como uma atividade maléfica, leviana, arruaceira, revolucionária, sem nenhum compromisso com o que quer que fosse. Os membros engajados no movimento faziam arruaças nas ruas de Zurique, para que as pessoas não dormissem, mandavam notícias falsas pelos jornais, procurando confundir os burgueses ou deixá-los revoltados. Por trás disso, estava o interesse em mostrar ao burguês a irrealidade do mundo, a futilidade do patriotismo e a origem desse sentimento pautada nos lucros da guerra .

O velho cabaré Voltaire deixou de existir antes mesmo de completar um ano, uma vez que o proprietário Senhor Ephraim, resolveu dar ouvidos às queixas dos honrados cidadãos, que não mais queriam tolerar aquelas coisas incríveis que se perpetravam em nome de Voltaire, na Spiegelgasse.

Com o fim do cabaré, procurou-se outro espaço para a continuação do Dada. Assim relatou Ball:


 

"Juntamente com Tzara, ocupei as salas da Galeria Corray (Bahnhofstrasse 19), e ontem inaugurei a Galeria Dada com uma exposição do Strurm. É uma continuação da idéia do cabaré, do ano passado. Entre a oferta e a inauguração transcorreram três dias. Estiveram presentes aproximadamente quarenta pessoas. Tzara chegou atrasado: assim, falei sobre nossa intenção de formar uma pequena sociedade de pessoas que se apoiam e cultivam mutuamente".


 

A segunda exposição foi de Kandinsky e Klee, considerados patriarcas espirituais do Dada. Logo após, foi a vez de De Chirico, integrado, à força, ao movimento.

A opinião pública de Zurique considerou essas exposições mais sérias, já que não foram movidas pela algazarra e pelo xingamento público. Apesar disso, acharam os quadros horrorosos. Fatos assim melhoravam um pouco a reputação dos dadaístas, gerando mais tolerância ao movimento.

2.6- O acaso em Dada


 

Jean (Hans)Arp
dizia que a tarefa do artista, era "Cortejar a Musa do Acaso"
, solicitando-lhe aquilo que ele chamava de concreções orgânicas: não gostava do termo "abstração", pois, (na concepção dele) implica disciplina e uma finalidade consciente e não uma dependência do acaso feliz.

Devido à liberdade extrema de pensamento e às despreocupações com questões que refletissem o que não fosse de seus desejos, os dadaístas perceberam que a melhor fonte para a Arte era a sua própria voz interior (do artista), a voz do desconhecido, chegando a uma nova experiência.

Arp, não satisfeito com um determinado trabalho, rasgou-o e jogou-o ao chão. Instantes depois, ao olhar para o chão, percebera que os pedaços ali jogados tinham uma composição muito agradável, realizado, por obra do puro acaso. Ele aceitou o desafio chamando aquilo de "destino", e colocou os pedaços exatamente na ordem determinada pelo "acaso".

A partir das exposições destes tipos de trabalhos, o acaso passou a ter um papel importante, tornando-se uma técnica baseada na pesquisa e na experiência e instigando-os como se fosse um fenômeno intelectual e emocional.

Os dadaístas adotaram o acaso, a voz do inconsciente, a alma, como sinal de protesto contra a univocidade racional do pensamento.

Desejavam que suas obras fossem lidas de diferentes maneiras, não contextualizando, mas, utilizando tal leitura para diferentes tipos de interpretações.

Na literatura, Tzara soube desenvolver esse processo ao máximo. No campo das artes plásticas, Arp tornou-se um dos representantes mais coerentes do trabalho ao acaso, possibilitando uma nova liberdade de expressão.

A respeito do acaso, Arp orientava: "O princípio do acaso, que abrange todos os princípios e é tão incompreensível para nós como as origens das quais nasce a vida, somente pode ser vivenciado se nos entregarmos inteiramente ao inconsciente. Afirmo que quem obedece a este princípio cria vida pura".

Segundo C. G. Jung, essas "coincidências" são o que ele chama de "força de atração das relações como se fora o sonho de uma consciência maior e inexplicável, incompreensível para nós". Entende ele que o acaso é uma "ordenação sem causa", um modo de ser, "a indicação de um estado que estabeleceu determinada ordem independente da causalidade".

Paul Kammerer, escreveu em 1919, mesma época em que os dadaístas estavam desenvolvendo o "acaso", o livro As Leis do Acaso, onde procura desenvolver toda uma teoria das relações oníricas e encontrar as leis que regem estas relações acausais.

Richter interpreta o acaso como aquele "inconsciente" que Freud já descobrira em 1900. Não havendo qualquer preconceito quanto ao limite da Arte, que poderia, da pintura ir para a escultura, da imagem, para a tipografia, para a colagem, para a fotografia e para a montagem fotográfica; da forma abstrata, para a imagem simbólica, desta para o filme, o relevo, o objet trouvé, o readymade.

Sem fronteira entre as artes, o pintor volta-se para a poesia, e o poeta dedica-se à pintura. O caminho certo a ser seguido era aquele que levasse para todos os lados. Se compararmos com os ismos anteriores ( Fovismo, Cubismo, Futurismo etc ), Dada apresenta-se como uma anarquia insolúvel, procurando destruir o raciocínio linear, destruir as leis impostas pelo sistema político vigente: nenhuma regra era bem vinda ao Dadaísmo; o maior interesse era, justamente não respeitar nada, chamando, assim, atenção para o movimento.

A incoerência e a coerência tinham que estar lado a lado nos dadaístas. A tensão entre as tendências opostas fazia parte do cotidiano. De um lado, entregavam-se ao acaso; por outro, era necessário estar sempre atento à consciência e buscar metas conscientes, o que acabou-se tornando uma incongruência entre o racional e o irracional, causando um grande conflito entre os artistas.

Dada sabia que Descartes dizia que o mundo pode ser explicado pela razão. Dada deu uma reviravolta nessa teoria que eles chamaram de "superstição", afirmando que Dada resistiu no conhecimento de que a razão e a anti-razão, o sentido e o absurdo, o planejamento e o acaso, a consciência e o inconsciente, são interdependentes e constituem partes necessárias de um todo.

Haviam dois grupos dentro de Dada. O grupo liderado por Ball e Arp, que buscavam uma nova arte, a fim de substituir o esteticismo gasto e irrelevante. Outro grupo liderado por Tzara e Picabia, empenhados na destruição pela zombaria e, também preparados para explorar a ironia de sua posição, burlando o público a respeito de sua identidade social como artista.

Os encontros Dada sempre se desenrolaram de modo semelhante e o soireé no salão Zur Kaufleuten, em abril de 1919, foi sem dúvida um escândalo. Tzara organizou de uma maneira bem precisa e generosa, tudo para o soireé; com todos os detalhes que um grande soireé Dada merecia.

Ao início, o artista Eggeling, fez uma preleção muito séria sobre a configuração elementar e a Arte abstrata. Preleção esta que inquietou o público, na medida em que não possuía ingredientes suficientes para tanto.

Outra artista, Susanne Perottet, usando máscara feita por Janco, lembrando a face de um negro, dançava com músicas de Schönberg, Satie e outros.

Käthe Wulff, poeta, recitava poemas de Huelsenbeck e Kandinsky, ficando a platéia bastante animada, dando risadas, fazendo manifestações exclamativas.

O que ocorreu depois desta apresentação foi que deixou o público enfurecido: o poema La Fièvre du Mâle de Tzara foi apresentado por 20 pessoas que não se importavam com sincronia ou ritmo.

Tzara foi muito hábil ao concluir a primeira parte do programa, simultaneamente, com estes poemas simultâneos; caso contrário, o quebra - quebra teria acontecido já a partir desta parte do espetáculo, pondo pelos ares, prematuramente, o soireé. Durante o primeiro intervalo, a animação foi geral, pela agitação do público que, instintivamente, já previa o que viria acontecer.

Ao iniciar a segunda parte, Richter, comedida e modestamente, voltou-se para o público, mandando-o para o Inferno; "discurso" que Tzara denominou Dada, Dada, Dada malicioso e elegante.

Logo após essa preleção, seguiram-se peças musicais especialmente compostas por Hans Heusser para o soireé, cujas melodias e antimelodias tinham acompanhado Dada desde a sua inauguração no Cabaré Voltaire.

No seguimento do Soireé, houve a apresentação de Arp, e de danças de Perottet.

Na apresentação do Dr. Walter Serner, o público realmente ficou bastante agitado e tenso. Um silêncio estranho e profundo ocorreu durante a sua apresentação; depois dela, iniciou-se uma gritaria raivosa em que se dizia: verme, porco, sem vergonha .de forma cada vez mais intensa de modo que Serner quase não podia ser ouvido.

De repente, ouve-se a seguinte frase: "Napoleão também foi um grande patife", a qual causou o início de um grande reboliço. Os jovens saltaram para o palco, munidos de pedaços de pau, destroçando tudo o que encontravam pela frente.

Com a apresentação interrompida, acenderam-se todas as luzes e, aos poucos, os rostos enlouquecidos de raiva foram se suavizando, à medida que aquelas atitudes pouco humanas não se manifestaram apenas pela provocações de Serner, a fúria do público provocado ao final, dera a Serner; o motivo para seu feito literário, fazendo com que aquele mesmo público viesse a ter consciência de si mesmo.

Após um intervalo de 20 minutos, iniciou-se a terceira parte do programa. Era tão agressiva quanto a anterior, porém transcorreu sem incidentes: Serner foi autorizado a voltar ao palco, e seus poemas, igualmente provocadores, não motivaram mais qualquer protesto, o mesmo acontecendo com os textos de Tzara.

Durante esse período tumultuado pela algazarra da platéia, Tzara foi procurado por toda a parte, não sendo encontrado. Descobriu-se depois que ele não tinha estado no soireé. Estava ele num restaurante; tranqüilo e satisfeito, contava o dinheiro dos ingressos, aproximadamente 1200 francos, quantia que Dada nunca tinha visto: acabara por vencer àquelas batidas.

Com o fim da Guerra, a Europa voltou a existir. As revoluções na Alemanha, na Rússia, as rebeliões na França e na Itália, haviam dividido os interesses do grupo e conduziram a atividade para modificações políticas. O Dada não pertencia mais só a Zurique; já há alguns anos Dada havia proliferado em outras cidades da Europa e a América do Norte, chegando a Nova York, nos EUA.


 


 


 


 

2.7- Kurt Schwitters: Dada em Hannover


 

    Em Hannover, assim como em Berlim, os dadaístas eram autônomos. Nesta, para se aceitar alguém no Dada, havia uma assembléia geral, presidida por Huelsenbeck, o qual decidiria se a pessoa poderia ou não, entrar no grupo. Não se desejava que qualquer pessoa freqüentasse o clube, assim, quando Kurt Schwitters tentou nele ingressar, Huelsenbeck rejeitou-o simplesmente por não gostar dele, levando, assim, Schwitters a abrir o seu próprio clube o qual batizou de MERZ, em Hannover.

A invenção ou a descoberta desta palavra tem tido muitas interpretações contraditórias.

Pela possibilidade do trocadilho, atribuem-se a MERZ numerosas etimologias, jogando com as rimas Herz (coração), Schmerz (dor) ou Scherz (piada), e evocando ainda o verbo ausmerzem (exterminador), como processo de purificação visando ao essencial.

A origem do vocábulo foi também, fruto das colagens de Schwitter: "quis o acaso que da palavra KomMERZiell só restasse o fragmento central". De resto, ele próprio asseverou: "creiam ou não em mim, a palavra MERZ não é mais do que a segunda sílaba de Kommerz". Dizem também que o nome é inspirado da fragmentação de ComMERZbank.

    Por ser autônomo, Schwitters não tinha compromisso em seguir o pensamento Dada de Zurique. Não falava em "morte da arte", "a–arte" ou "antiarte". Não se preocupava em modificar o mundo, os valores, o presente, o passado ou o futuro. Procurava arte em qualquer objeto que lhe interessasse, como um bilhete de bonde, um envelope, papel de embrulhar queijo, anel de charuto. Tudo o que jogavam fora, por ele era apreciado, colocando nos bolsos de seu paletó, os objetos encontrados pelas ruas em que andava, transformando esses "achados" em arte, e dando um lugar de honra na vida para tais objetos. Quando não escrevia poesias, fazia colagens, trabalhava na construção de sua coluna, declamava, desenhava, imprimia, recortava revistas, recebia amigos, editava Merz.

    Schwitters fazia seu trabalho não de uma forma aleatória; cada construção verbal ou formal era estruturada de maneira bem planejada e consciente. Utilizava, em seus poemas, uma linguagem típica de Hannover, um dialeto completamente inadequado à linguagem poética. Mas, no fim, todos se mostraram dispostos a aceitar o linguajar do local como língua universal. Organizou, juntamente com Van Doesburg, uma viagem cultural Dada pela Holanda, formando uma dupla entrosada.

Numa certa apresentação, na Holanda, enquanto Van Doesburg fazia explanações, explicando o espírito Dada, Schwitters o interrompia imitando latidos de cães. O público ouvinte ficava indignado, mas ao se apresentar, subia ao pódio, a fim de, além dos latidos, emitir outros sons e declamar poemas provavelmente naturalistas como "Ana Flor" ou "Revolução em Revon".

Esta demonstração tinha o objetivo de tirar o público de sua letargia confortável e aconchegante. Schwitters, com sua força persuasiva e sua espontaneidade inabaláveis conseguia desarmar o público em qualquer lugar que fosse, obtendo, sempre sucesso neste sentido.

Van Doesburg, que ao assumir-se Dadaísta passou a ser chamado de Bonset, introduziu, assim, o Dadaísmo na Holanda com a ajuda de Schwitters.

    Na poesia, Schwitters, que era um excelente poeta, fazia-a de uma forma bem pensada, com uma lógica Schwittersiana inatacável, tendo, inclusive, sua própria teoria de arte – poética. Nas artes plásticas, utilizava o acaso, mas de uma maneira mais espontânea. Arriscava tudo e aparentemente não se preocupava com os efeitos estéticos, como a harmonia e a beleza. O acaso vinha ao seu encontro na rua, no restaurante, em viagens. O mundo estava cheio de acasos para ajudá-lo, mas, em nenhum momento, deixou de ser o mestre e pensador que planejava tudo.

    Com o domínio de Hitler na Alemanha, Schwitters foi obrigado a fugir; fora banido como "Bolchevista da Cultura".

Em janeiro de 1937, ele e seu filho Ernst saíram da Alemanha, refugiando-se na Noruega. Em 1940, tendo de fugir ao avanço das tropas alemãs, partiram para a Inglaterra onde, doente, passará um ano e meio em diversos campos de internamento. Libertado em 1941, instalou-se em Londres com seu filho, e, encontrando asilo na Inglaterra, viveu na propriedade de um certo fazendeiro chamado Pierce, onde faleceu com problemas do coração, em 1948, aos 60 anos de idade.

2.8- Max Ernst: Dada em Colônia


 

    Em Hannover, o que prevalecia, no Dada, era a intuição. Schwitters era muito inteligente, mas não era considerado um intelectual. Max Ernst utilizava a intuição e o intelecto, de forma equilibrada. Era um intelectual extremamente inteligente e, com uma sensibilidade incomum, expressava-se através de colagens, confeccionando-as de maneira diferente dos outros artistas, abrindo novas portas misteriosas e sinistras para o Dada.

O novo, nas colagens de Ernst, destacava-se num componente literário – intelectual. Seus trabalhos não eram simples quadros, mas narrativas, cujo conteúdo era, no entender de alguns colegas, bastante perigoso. Desenvolveu o método da Frottage, observando o assoalho de madeira de seu quarto. Fascinado pelo estranho desenho da madeira, ele cobriu-o com uma folha de papel, e esfregando um lápis sobre ela obteve um decalque destes padrões naturais que induziam a novas invenções.

    A Frottage não foi inventada por Ernst; ele apenas a redescobriu. Esta técnica já era conhecida na Grécia e na China antigas. Nas cavernas da China e em lápides tumulares, bem como na Grécia Clássica, existia o hábito de se gravar na pedra cenas em que se apresentavam deuses, feitos heróicos, acontecimentos belicosos. Esfregando estes desenhos, com o auxílio de tintas, sobre o papel de arroz ou pergaminho, obtinha-se uma cópia inversa destas cenas. Max Ernst desenvolveu sutilmente este processo e aperfeiçoou várias técnicas de cópia e impressão que devem ser respeitadas como um segredo que somente ele conhecia.

    Segundo o programa Dada de Colônia, deveria haver um paralelo entre os assuntos artístico e político, ao contrário dos dadaístas de Berlim, que planejavam usar o movimento para fins de propaganda política.

Colônia ficava distante dos tiros disparados junto ao palácio de Berlim, tampouco vivenciava as matanças junto a Landwehrkanal e os assassinatos de Liebknescht e Rosa de Luxemburgo, enquanto que Berlim vivenciou toda essa tragédia. Talvez por isso, Colônia não se interessava em participar de movimento político tão intenso na Alemanha daquela época.

    O Ventilador, uma revista fundada por Johannes Theodor Baargeld, jovem pintor que Ernst havia conhecido em Colônia, era um grande sucesso: suas principais reportagens atacavam o Estado e a Igreja, as altas personalidades e a Arte.

Max Ernst colaborou com trabalhos para esta revista, porém não gostava do entrelaçamento política antiarte que ela enfocava, apesar de seus poemas e desenhos ali se destacarem.

Um rico banqueiro, pai do jovem Baargeld, estava muito preocupado com seu filho, pois este mostrava-se demasiadamente inclinado para o Comunismo. Assim, Ernst e Arp, juntos, influenciaram o jovem Baargeld, mostrando-lhe que Dada ia muito além do Comunismo e podia liberar o mundo através de uma nova liberdade interior, com uma poderosa expressão exterior, tanto artística quanto provocatória: por intermédio do Dada, cada um poderia tornar-se uma personalidade individualmente! Com o interesse de o jovem Baargeld trocar o comunismo por uma filiação Dada, seu pai ficou tão feliz que passou a apoiar Arp e Ernst espiritual e financeiramente, o que lhe permitiu fundar a revista Schammade, que contava com outros colaboradores como Breton, Eluard, Aragon dentre outros e o Dada passou a ser mais ativo em Colônia.

A primeira apresentação Dada em Colônia foi anunciada para o dia 20 de abril de 1920 com Arp, Baargeld e Ernst, porém não pôde ser realizada sem alguns imprevistos, pois a polícia tomara conhecimento do evento e fôra alertada para ter cuidado com os dadaístas, já que eram piores que os comunistas. O acesso ao evento passava pelo mictório de uma cervejaria, cujos fregueses nada suspeitavam.

Os visitantes foram recebidos, no dia da inauguração, por uma garotinha de aproximadamente 10 anos, vestida com traje de primeira comunhão, recitando poemas obscenos.

Nesta apresentação, estavam entulhados diversos objetos sugestivos de colagens e fotomontagens. Foram recitados poemas dos quais os ouvintes podiam extrair as associações mais fantásticas.

O choque inesperado dos fregueses da cervejaria causou uma inquietação tão grande que a polícia, já alertada, fechou o que eles chamaram de "feira".

    A princípio, entendeu-se que aquela apresentação era um empreendimento de homossexuais, mas constatando-se que o único objeto criticável do ponto de vista de moral era de autoria de Albrecht Dürer, foi permitida a reabertura da "feira".

    O chefe de polícia tentou processar os dadaístas por fraude, por cobrarem entrada para uma exposição de arte que, de fato, nada tinha disso. Ernst informou ao policial que o que ocorreu no espaço, era uma exposição Dada. Que ele nunca havia afirmado que Dada tivesse qualquer coisa a ver com Arte. Se o público confunde as coisas, então a culpa não era de nenhum Dadaísta.

    Baargeld e Ernst realizavam alguns trabalhos em conjunto. Este processo não era uma novidade. A Idade Média já o utilizava e os cubistas o reintroduziram. Produziram, assim, uma série de colagens chamada "Fotogagas" que era uma abreviação de uma frase: "Fabrication des tableaux garantis gazométriques".

     Em sua passagem pelo Dadaísmo, Ernst enfocou que as propostas dadaístas sobre a antiarte eram sérias, mas, não poderiam ser realizadas na prática, porque, por mais antiartísticas que fosse sua intenção (das propostas), sempre se impõe Arte como a "força da natureza". Neste sentido, a frase dita por Tzara "A destruição da arte com meios artísticos" na verdade, significava apenas, "A destruição da arte para a construção de uma nova arte".

    Dada liberou o espírito, mobilizou os sentidos e por isso, produziu em toda parte obras de arte próprias, até mesmo quando não se podiam relacioná-las direta ou indiretamente com as teorias oficiais de Dada. Freqüentemente elas foram criadas em oposições a estas teorias.


 

2.9- Tristan Tzara: Dada em Paris


 

     Desde 1917, Paris tinha conhecimento do Dada. Tzara, Monsieur Dada, para os franceses, ali passou a residir no final de 1919. Ainda em Zurique, ele mantinha contato com os círculos literários de Paris, correspondia-se com Apollinaire e trabalhava nas revistas Prae-Dada, Nord-Sud e na Sic. Paris era o centro das Artes na Europa e acabou absorvendo o Dada, com seu jogo com a língua, os sons, as palavras, as associações de sons. Experimentavam o fascínio de fazer os versos soar e de derivar seus sons e conteúdos:

        "Paroi parée de paresse de paroisse

        A charge de revanche et a verge de rechange

        Sacre de printemps, crasse de tympan

        Daily lady cherche démêlés

        avec Daily Mail"

                    Marcel Duchamp


 

        Os escritores franceses, a princípio, hesitavam em participar do movimento Dadaísta. Mas em 1918, o número 4/5 do Dada de Zurique contava com autores parisienses da avant-gard, como Breton, Aragon, Soupault, Pibemont-Dessaignes entre outros. Em Paris, editaram a revista Littérature, que não tinha nada a ver com o Dada. Já o segundo número da revista, sem dúvida era Dada, com influências de Zurique e do próprio Tzara, que participou desta edição.

        A divulgação de Dada em Paris ficou por conta de Picabia, que o fez através de revistas, jornais, discussões em cafés, enfatizando o nome de Tristan Tzara que passava a ser considerado um profeta, sendo esperado pelo grupo jovem de Paris com grandes expectativas. Dada em Paris, durante um bom tempo, ostentou o absurdo, o efêmero e, na maioria das vezes, o ridículo.    

Em Paris, Dada tornou-se um movimento quase que exclusivamente de literatos, e não de artistas plásticos. Apesar de a pintura estar lado a lado com a literatura, os pintores não tinham um papel decisivo, seus trabalhos não eram influenciados pelos movimento parisiense, continuando o que haviam iniciado em outros lugares. No entanto, eles aplaudiam e apoiavam os literatos de Dada identificando-se com a rebelião que eles comandaram. Apesar da grande contribuição dos artistas plásticos de Paris, ninguém conseguiu criar uma tendência com características Dada diferente do que já havia sido feito anteriormente, ou seja, não acrescentaram nada novo ao que já existia antes. Muitos se fixaram em Paris, fortalecendo Dada e, a causa Dada, por sua vez, revigorou os artistas.

Algumas atividades dadaístas ficaram famosas, como a do Festival Dada     na sala Gaveau, a de 1921, na sala das Sociétés Savantes. Surgiram outras revistas como a Proverbe de Eluard; Cannibale, de Picabia; Z de Paul Dernée. O tom do Dadaísmo parisiense era cáustico, pungente, impertinente, apodíctico:


 

O Futurismo morreu. De quê? De Dada... O cubismo constrói uma catedral com patê de fígado artístico. O que faz Dada? O expressionismo envenena as sardinhas artísticas. O que faz Dada? O simultaneísmo ainda está na sua primeira comunhão artística. O que faz Dada? O futurismo pretende subir num lírico elevador artístico. O que faz Dada? O unanimismo abraça o todismo e pesca com vara artística. O que faz dada?... Cinqüenta francos de gorjeta a quem encontrar a maneira de nos explicar Dada... Dada sempre existiu. A Santa Virgem foi Dadaísta. Dadá nunca tem razão. Cidadãos, companheiros, senhoras e senhores, desconfiem das imitações. Os imitadores de Dada querem apresentar Dada sob uma forma artística que ele nunca teve. Cidadãos, hoje lhes é apresentado de uma forma pornográfica um espírito vulgar e barroco que não é absolutamente a idiotice pura reivindicada por Dada – mas o dogmatismo e a imbecilidade pretensiosa.


 

O bigode que Duchamp desenhou no rosto da Monalisa de Leonardo da Vinci, assinando a obra como se fosse sua; o macaco vivo que Picabia queria amarrar dentro de uma moldura vazia para expô-lo numa mostra coletiva, poderíamos talvez afirmar, foram a verdadeira essência Dadaísta.


 


 

2.10- Huelsenbeck, Hausmann: Dada em Berlim


 

        Com o objetivo de ser uma manifestação de simpatia pelo Dadaísmo internacional, em fevereiro de 1918, teve início o Dada em Berlim com o clima e os companheiros com os quais a bomba Dada, testada em Zurique, poderia ser finalmente explodida.

Huelsenbeck, em seu primeiro discurso Dada na Alemanha, empenhou-se em investidas raivosas contra o Expressionismo, o Futurismo e o Cubismo; condenando a arte abstrata e afirmando que todos esses movimentos estavam superados pelo Dadaísmo. Em seu manifesto, procurava consertar a Arte que ficara sem estrutura pelas diferentes tendências artísticas que a seu ver, eram erradas. Apesar da violência, este manifesto tornou-se uma declaração universal.

        Berlim estava em plena revolução, com tiros nas ruas e disparos pelos telhados. Dada decidiu intervir diretamente neste fato, sem inibição, com audácia, irreverência e entusiasmo. Apesar do tiroteio que Berlim presenciava, Dada iniciava suas atividades, atraindo a atenção de todos e formando um círculo de verdadeiros dadaístas. Eram extremamente críticos e acreditavam que os colegas de Zurique, embora tivessem chocado os burgueses de todas as maneiras, não haviam feito uma revolução verdadeira.

Estava-se em meio à revolução e, no meio dela estava Dada que ora se apoiava no comunismo, ora no bolchevismo, ora no anarquismo ora no que mais aparecesse. A verdadeira revolução desencadeou-se em Berlim na concepção do Dada berlinense.

        Hausmann proclamava a antiarte. Suas obras, em grande parte, assemelhavam-se à arte abstrata, tão desprezada, sobretudo por Huelsenbeck e Grosz. Neste contexto, as colagens e fotomontagens foram contribuições importantes para uma "nova" arte, porque abriam caminhos que levavam à formação de uma imagem do mundo. Também foram utilizados poemas sonoristas, de uma tonalidade mais amena que os das outras cidades.

        Hausmann, dizendo-se inventor da fotomontagem, assim descrevia esta técnica:

                

                "Definições da fotomontagem: Os dadaístas, que tinham "inventado" o poema estático, o simultâneo e o puramente fonético, aplicaram, de maneira coerente, os mesmos princípios à representação plástica. Foram os primeiros a utilizar o material da fotografia para, a partir de partes da estrutura, de natureza material e espacial peculiar, muitas vezes opostas umas às outras, criar uma nova unidade que pudesse arrancar ao caos dos tempos de guerra e revolução uma imagem nova, do ponto de vista tanto óptico como intelectual. E eles sabiam que seu método encerrava uma grande força propagandística, que a vida contemporânea não tinha coragem de desenvolver e escolher...

                O campo da fotomontagem tem tantas possibilidades quantas são as modificações do meio, de sua estrutura social e das construções psicológicas que dela resultam – e todos os dias este meio se modifica...

                Na sua forma inicial, a fotomontagem foi uma explosão de pontos de vista e de níveis imagéticos emaranhados, mais avançada, na sua complexidade, do que a pintura futurista. Em toda parte reconheceu-se que o elemento imagético óptico representa um recurso extremamente versátil, que no caso específico da fotomontagem, com seus contrastes de estruturas e dimensões, por exemplo áspero oposto a liso, fotografia aérea oposta à fotografia a pouca distância, perspectiva oposta à superfície, permite tecnicamente a maior variabilidade ou as elaborações mais claras, do ponto de vista formal-dialético... A capacidade de avaliar os contrastes mais convincentes, a distribuição do equilíbrio, em suma, o aspecto formal-dialético, inerente à fotomontagem, deverá assegurar-lhe uma longa vida, passível de constantes aperfeiçoamentos..."


 

        Grosz e Heartfield não atribuíam a descoberta de fotomontagem a Hausmann e a honra da descoberta de tal método artístico é destinada a eles mesmos. Grosz relatava assim a descoberta:


 

"Em 1916, quando Jonny Heartfield e eu, às cinco horas de uma manhã de maio, inventamos a fotomontagem no meu ateliê do Südende, nenhum dos dois imaginava as grandes possibilidades inerentes a esta descoberta, e tampouco o caminho espinhoso, embora vitorioso, que ela haveria de seguir.

Numa cartolina colamos, desordenadamente, anúncios de cintas para hérnias, de cancioneiros estudantis e comida para cães, etiquetas de garravas de pinga e vinho, fotografias de jornais ilustrados, recortados arbitrariamente e montados sem qualquer sentido... Compusemos os recortes de tal maneira que as imagens diziam o que, formulado em palavras, teria sido censurado. Assim fizemos cartões-postais, como se tivessem sido enviados do front para casa, ou de casa para o front. A partir disso, alguns amigos, entre eles Tretjakoff, criaram a lenda segundo a qual o "povo anônimo" teria inventado a fotomontagem... Certo é que tais rumores animaram Heartfield a transformar uma brincadeira, inicialmente excitante politicamente, numa técnica consciente".


 

Além de Heartfield e Hausmann, também Baader e Hannah Höech usaram esta técnica como nova forma de expressão Dadaísta.

    Durante os 3 anos de existência do Dada berlinense, uma série de revistas foram publicadas. Colaboravam escritores, poetas, pintores, médicos, aventureiros, amigos e amigas, bem como Johannes Baader, que se apresentava como "Deus-pai de Dada". Ele declarado demente, pela polícia, desaparecia de tempos em tempos, a fim de passar férias em um sanatório; entretanto, tal declaração policial não era novidade, pois tanto em Zurique quanto em Berlim, os jornais haviam atestado a deterioração mental do grupo, alcançando a "licença de caça", ou seja, de ser considerado demente, louco.

    Quanto maior a agressividade nas apresentações, mais postura intelectual o grupo de Berlim alcançava com seus manifestos contra a estúpida burguesia, contra um expressionismo excêntrico enfim, contra tudo. Utilizavam seus próprios escândalos, brigas e xingamentos como propaganda para o grupo. Os representantes mais destacados foram Huelsenbeck, Hausmann, Baader, Grosz e os irmãos Herzfilde.

    Dada Berlim foi mais um movimento político do que artístico, e sua idéia de jogar a arte nas lixeiras, tornou-se não uma luta contra a arte, fazendo a antiarte, e sim uma luta contra as condições sociais alemãs.


 


 

2.11- Picabia, Duchamp, Man Ray: Dada em Nova York


 

Aparentemente desconhecendo-se o que acontecia em Zurique, originou-se em Nova York, um grupo que propunha a antiarte como início de uma nova arte.

Altred Stieglitz liderou por um tempo, não um cabaré como em Zurique, mas uma galeria de fotografias, chamada 291, situada na Fifth Avenue 291, onde refletiam os movimentos que se destacavam na Europa como o Fovismo, o Cubismo e o Expressionismo, nascendo uma sociedade entre a fotografia artística e a pintura moderna.

Picabia fazia parte do grupo. Mesmo tendo pouca coisa em comum com Stieglitz, trabalhava na revista deste, chamada de Câmara Work. Picabia tinha "alma" dadaísta e antes mesmo da primeira mostra em Zurique, publicou, em 1913, uma sátira agressiva e irônica sobre a arte abstrata, colocando em dúvida sua opinião a respeito da abstração, já que, em seus escritos anteriores, havia dito que só através da abstração era possível expressar a realidade de um modo puramente visual ou ético. Não respeitava aos valores vigentes e sua ânsia era destruir tudo o que até então era considerado Arte. Desprezava-a entretanto, produzindo obras surpreendentes, que mostravam mais o seu talento que o seu desprezo por ela.

Quando Picabia veio da Espanha para Nova York, Duchamp e Man Ray já se encontravam lá, produzindo trabalhos bem criativos.


Arthur Cravan artista dadaísta, participava deste grupo e foi uma espécie de precursor adotado do movimento Dada americano, chegando às últimas conseqüências na postura Dada sobre a destruição: destruiu-se a si próprio, suicidando, tornando-se o herói niilista de uma época que havia sido invadida pelas tendências do niilismo, mostrando todo seu desprezo pelo mundo.

Man Ray nascera com o nome de Emmanuel Rudnitsky e desejava ser pintor, mas, para sobreviver, tornou-se fotógrafo (possivelmente a exemplo de Alfred Stieglitz) transformando seus ensaios fotográficos em arte, através de ousados efeitos de luz ou reenquadramento.

Participou, das mais duvidosas orgias, os célebres bacanais Dada, para os quais se deslocava sempre com as inseparáveis máquinas fotográficas.

Curiosamente, ele próprio tinha dificuldades em considerar a foto como Arte, tendo dito um dia: "comecei a arte discutível da fotografia para sobreviver". Revelou que pegou uma máquina fotográfica pela primeira vez para, simplesmente, possuir uma cópia das suas telas. Em Paris, fotografou as obras de arte da coleção do amigo Marcel Duchamp, que redigia os textos que acompanhavam as imagens. Pouco tempo depois, a pintura passaria para segundo plano.

Man Ray, o único americano a integrar o grupo, chegou a Paris no dia da Bastilha, em 1921. Conhecera Duchamp e Picabia quando eles estiveram em Nova York, recebendo calorosa acolhida dos dadaístas franceses. Em Paris, Man Ray inventou a fotografia sem máquina, que consistia em colocar determinados objetos sobre papel fotográfico expondo-os à luz a partir de determinados ângulos. Criou, assim novas paisagens poéticas, denominando-as de Raygrams.

Se Stieglitz promovia a fotografia como arte, Man Ray, evidentemente abriu mais ainda as portas para a fotografia artística. Em 1923, começou suas experiências com técnicas cinematográficas, o que intitulou como um exercício Dadaísta The Return to Reason, que consistia num filme de 3 minutos.

Duchamp achava que deveria introduzir um pouco de inteligência na pintura. Em 1915, foi de Paris para Nova York, levando uma ampola de vidro que continha 50cm3 de ar de Paris, para presentear o amigo Walter Arensberg.

Duchamp não estava satisfeito com o que a arte se propunha até então. Desejava que ela seguisse para uma expressão intelectual em detrimento de uma expressão animal. Reagindo ao comércio da arte, Duchamp produziu os readymade, presenteando o público com uma roda de bicicleta em cima de um banquinho, um secador de garrafas e um urinol, decretando que esses objetos eram obras de arte, na medida em que ele estava assim designando. Ao escolher os objetos, ele os retirava do mundo dos mortos para inseri-los no reino vivo das obras de arte. O que fazia com que o objeto se posicionasse como obra de arte era a maneira como era observado pelo espectador.

O nome readymade foi inventado por Duchamp em 1915, em Nova York. A escolha de um readymade era feita por puro prazer estético, indiferente ao bom ou mau gosto, numa reação de indiferença visual.

Duchamp também produziu uma performance em que se travestia da personagem que intitulou Rrose Sélavy, com a pretensão de ser andrógino.

A escolha do nome Rose, provavelmente, fazia uma referência indireta ao círculo poético das rosas criado pela famosa lésbica judia Gertrude Stein.

O fato é que Rrose Sélavy tornou-se uma personificação emblemática dessa tendência andrógina.

Numa entrevista a Pierre Cabane, Duchamp disse:

        "Eu desejava mudar a minha identidade e, primeiramente, eu pensei adaptar um nome judeu. Eu era católico, e esta passagem de uma religião para outra já significava uma mudança. Mas não encontrei nenhum nome judeu de que gostasse ou despertasse a minha fantasia e, de repente, tive uma idéia: Porque não mudar de sexo? Era muito mais fácil!

        E foi assim que surgiu o nome Rrose Sélavy. Hoje soa muito bem, porque mesmo os nomes mudam com os tempos, mas naquela altura era um nome parvo. Os dois "R" têm a ver com o quadro de Picabia OEil Cacodylate, que estava pendurado no bar "Le Boeuf sur le Toit"... e que ele queria que todos os amigos assinassem. Penso que escrevi Pi qu'habilla Rrose Sélavy [ foneticamente Picabia lárrose cést lavie ]".

    

Enquanto Picabia afirmava que a arte estava morta, numa atitude antiarte, Duchamp denominava sua posição numa equivalência (a-arte é a a-moral), ou seja, não apenas um esvaziamento da arte, mas também uma redução dos conteúdos da alma da vida.

Com isso, Duchamp deu um passo lógico e, por isso mesmo necessário, mas também fatal. Ele modificou os marcos fronteiriços dos valores de tal modo, que em toda parte eles apontavam para o "nada". Este lado, fatal, fazia parte do movimento Dada. Duchamp apenas revelou uma outra dimensão Dada.

    O Dadaísmo foi, sem dúvida, um movimento que causou grande impacto na História da Arte, pois, através de sua antiarte, produziu uma nova arte, sem preocupação com uma análise ou mesmo com alguma crítica, já que uma análise ou positiva ou negativa tinha a mesma conotação para eles. Em sua proposta niilista, trouxe o absurdo para a arte, fazendo-nos pensar e analisar sobre o que se fazia até então, incomodando-nos em tentar obter uma nova visão artística, não só apreciativa, mas também intelectual.

    Nascido de uma revolta, Dada não poderia ser pacífico. Provocando escândalos, chamou a atenção para o grupo. Tornando-se um sucesso, com o tempo desencadeou sua própria morte. A rebeldia tornou-se um ponto fundamental no movimento. Dada foi tudo e nada; foi vida e morte; foi sucesso e fracasso; Dadá não desejou nada, não quis viver, nem morrer, só quis ser Dada, mas como tudo tem um tempo, o fim um dia chegaria e Dada despede-se da vida em 1923, curtindo sua própria morte, já que este tema sempre esteve presente nele.

    Segundo, percebemos, em nossas leituras, com o fim do Dadaísmo, artistas enveredaram por outros caminhos em facções e fragmentos: da imensa balbúrdia desse vociferante campo de batalha é que marcharam as novas tropas do Surrealismo.

    Ao contrário de Dada, na projeção anarquista em relação às próprias idéias, o Surrealismo não iria expirar por fazer piada de si mesmo. O Surrealismo aproveitou-se, dentre outras coisas, da onda de simbolismo freudiano dos sonhos que dominava Paris. Retornou, por outro lado, à tradição da pintura em cavalete, um passo mais aceitável em relação às piruetas, artimanhas e engenhocas dos dadaístas, se bem que os objetos de arte de Man Ray remontassem ao inventivo humor de Duchamp ao exibir uma pá, uma prateleira de vinho ou um despojado assento como escultura trivial.


 


 

3- DADA MOTIVANDO NOVOS MOVIMENTOS


 


 

"Dada caiu como a gota de chuva do céu. Os neodadaístas aprenderam a imitar o cair, mas não a gota da chuva".

Raoul Hausmann


 


 

    Em deixando de existir oficialmente, o Dadaísmo não chegou a se extinguir: continuou percorrendo caminhos, com alguns de seus integrantes sendo Dada até à morte.

    Schwitters produziu, em sua própria casa, o que chamou de "MERZBAU", uma escultura - arquitetura, que ocupava um quarto de sua casa; onde ele colocava na escultura, lembranças de amigos, as quais eram sempre recobertas por objetos, num crescimento orgânico contínuo e ininterrupto. Este crescimento obrigou-o a furar o teto do aposento para prosseguir com o trabalho no andar de cima, numa criatividade incessante e livre.

Esta primeira obra foi destruída por uma bomba durante, a Segunda Guerra Mundial.

Quando emigrou para a Noruega, Schwitters iniciou um outro Merzbau e, na Inglaterra, num celeiro de Westmoreland, onde morreria deu início a um terceiro, que não chegou a concluir.

    Doesburg, sua esposa Sophie e Arp, certa vez, foram convidados para decorar um restaurante. Nessa decoração, surgiu o "afresco abstrato" que, com perfeito equilíbrio, unia arte e antiarte, o que não poderíamos dizer ser Dada e sim uma nova arte, fruto de Dada, que foi se proliferando por todo o mundo.

    Em 1927/28, o filme "Aparição da manhã", feito por Richter, tornou-se um genuíno documento Dadaísta. Ele mostrava a rebelião dos objetos, dos chapéus, das xícaras, gravatas, mangueiras, etc. contra o ser humano. Era um filme mudo, em cujo final a velha hierarquia era restabelecida, e o homem - senhor dominava o objeto escravo.

    Marcel Janco nunca esqueceu Dada: editava uma revista Romena chamada Contimporanul, onde, continuava a desenvolver teses Dada para a vida prática.

    Picabia integrou-se ao balé sueco em Paris e realizou um filme que seria apresentado durante o intervalo do balé. O filme tinha, como cena, um enterro em que um carro fúnebre era puxado por um camelo. Como o filme era mudo, Picabia pretendia que a sonoridade do filme fosse o murmúrio que os espectadores fariam durante o intervalo. Porém, o público, estarrecido, nada pronunciou, deixando-o furioso. Na ocasião, Picabia gritava pedindo ao público para falar, dizer, alguma coisa. Entretanto o público não se manifestou.

    Em quase todos os países ocidentais, havia grupos de pessoas que seguiam os lemas Dada. Nos anos 50/60, movimentos com origem em Dada, organizaram-se para reviver toda uma época apoteótica da antiarte. A situação moral e intelectual era parecida com a do surgimento do Dada.

O novo Dada encontrou uma grande ressonância, em um desejo que os integrantes diziam ser interno, de prosseguir com as ideologias Dada. Afirmavam que havia uma voz interior que os chamava para essa nova proposta, embora, fosse a voz do "nada". Esta geração de artistas se propuseram a fazer ALGO do NADA.


 


 

3.1- Influências Dada inspirando os Neo Dada


 

    Na década de 50, surgiu a Pop Art, um movimento cuja característica principal era o uso do objeto comum e elementos da cultura de massa. Nascido na Inglaterra, ganhou sua verdadeira força e dimensão nos Estados Unidos.

    O movimento Pop Art foi, ao mesmo tempo, original e crítico. Utilizavam uma iconografia variada, procedente, sobretudo, dos meios e canais de comunicação, como a televisão, o cinema, a fotografia, os quadrinhos e a publicidade. Era a volta de uma arte figurativa, em oposição ao Expressionismo Abstrato que dominava a Arte no final da Segunda Guerra Mundial.

    Ao fim de dez anos, o Expressionismo Abstrato parecia inapelavelmente banal. Pretendendo fazer uma pintura de ação, a maioria dos artistas utilizavam os mesmos recursos, jogando galões de tintas sobre as telas para faturar sobre algo que, rapidamente, tornou-se uma padronização. Em meados dos anos 50, jovens rebelaram-se contra essas falsas abstrações. "Não foi um ato de hostilidade", disse Jasper Johns, explicando porque não escolheu um caminho trilhado por Pollock. "Foi um ato de autodefinição".

    Juntamente com Jasper Johns, Robert Rauschenberg liderou a ruptura, dizendo: "Vi que as idéias não são bens imóveis. Existe espaço suficiente para se mover, e não é preciso ficar no mesmo lugar ou na imitação. Todo mundo fazia como Kooning, Newman, Reinhardt. Só dois artistas não copiavam outros artistas: Jasper Johns e eu".

    Neste período, o artista de maior prestígio nos Estados Unidos era, sem dúvida, William de Kooning. Ele era uma espécie de líder e era muito respeitado por todos os artistas. Em 1953, num ato que foi a quintessência do desafio, Rauschenberg produziu uma obra de arte, apagando um desenho feito por Kooning.

Esse gesto de "cabeças vão rolar" simbolizou o momento em que o movimento iniciado por Rauschenberg e Johns pôs fim ao domínio da abstração no mundo da arte. A partir de então, o palco estava armado para artistas que colhiam temas diretamente da cultura popular. Com espírito bem humorado, a nova arte "apagava" a pretensão da pintura de ação.    

        Com raízes no Dadaísmo de Duchamp, a Pop Art começou a se formar quando alguns artistas, após estudarem os símbolos e produtos do mundo da propaganda dos Estados Unidos, passaram a transformá-los em temas para suas obras.

Hausmann, Hülsenbeck, Richter e Marcel Duchamp sentiam raiva e desprezo em pelo neo Dada, pelo Novo Realismo e pela Pop Art.

Richter citou uma carta que lhe foi endereçada por Duchamp na qual, este, indignado se revolta contra essas novas artes:


 

Esse neo-Dada, a que eles chamam neo-realismo, arte pop, assemblage, etc., é uma saída fácil e sustenta-se do que o dadá fez. Quando descobri os readymade pensei estar desencorajando a estética. No neo-Dada, eles tomaram os meus readymade e recuperaram a beleza estética neles. Joguei-lhes o porta-garrafa e o mictório na cara como um desafio... e agora eles o admiram por sua beleza estética!


 


 

À primeira vista, na Art Pop, houve um ressurgimento de técnicas e truques dadaístas, mas sem o menor respaldo na filosofia Dada.

O que os artistas da Pop Art fizeram inicialmente, foi encontrar coisas positivas no gestos de oposição que Dada originou, na sua antiarte, e partiram para alguma coisa possível de se construir. A Pop Art era um movimento culto e altamente consciente. Não existia, nele, qualquer estilo e os adeptos eram hostis a categorizações.

Na Pop Art, o épico foi substituído pelo cotidiano e o que se produzia em massa recebeu a mesma importância que aquilo que era único e irreproduzível. A distinção entre "arte elevada" e "arte vulgar" foi desaparecendo dentro de uma proposta vanguardista, iconoclasta e crítica em relação ao próprio sistema sócio econômico em que nasceu. Por esta face polêmica, a Pop Art foi, muitas vezes tachado de vulgar, antiestético e irreverente.

Enquanto o Dadaísmo foi primordialmente um ato rebelde e romântico, a Pop Art foi uma paródia. Foi antiromântico, antiemocional, antiintelectual e antiarte.

Paralelo ao neo Dada americano, surgiu na Europa o movimento Noveau Réalisme, formado nos anos 60 sob a proteção de Pierre Restany. Os adeptos tentavam apropriar-se do real contingente, com referência direta ao readymade de Duchamp e ao Merz de Schwitters. O movimento foi formado no dia 27 de outubro de 1960, na casa de Yves Klein, tendo como participantes: Arman, Dufrêne, Heins, Raysse, Spoerri, Tinguely e Villeglé. Posteriormente entraram no grupo: César, Rotella e Christo.

Nos anos 50, tanto de um lado quanto do outro lado do atlântico, houve uma redescoberta do Dada a qual surgiu como um antídoto para um modernismo cada vez mais canonizado na poesia, na narrativa e na pintura.


 


 

3.2- Dada Fluxus Dada


 

Como Dada, Fluxus era, aparentemente, antiarte. Seus membros começaram odiando a reverencial pomposidade com a qual se celebrava a Arte e acabaram por desprezá-la. "Chega de Arte! É preciso demolir a cultura séria", frisou Henry Flynt, um dos líderes do Fluxus que, assim como os Dada, clamavam pela morte da cultura nos anos 60.

Fluxus iniciou-se na Alemanha Ocidental, onde George Maciunas passou a residir depois de fechar sua galeria em Nova York. Fluxus seria o nome que Maciunas havia reservado para um jornal que nunca foi impresso. O movimento trabalhou com a estética de negação: negava o mercado de arte, a noção do grande criador individual, o artista como um herói ou redentor, o objeto de arte como mercadoria, e as fronteiras tradicionalmente definidas entre música, literatura e artes visuais.

O primeiro concerto Fluxus foi realizado em setembro de 1962, com a participação de Higgins e sua mulher Alison Knowles. No ano seguinte, o casal e Maciunas retornaram a Nova York: o Fluxus desenvolveu uma atividade incessante a partir de 1963 e durante todo ano de 1964, atuou em galerias, pequenos teatros, ruas e praças.

Seus eventos eram os "Concertos Fluxus", os festivais e os encontros. Incorporavam todas as disciplinas: a nova música, a dança, o Happening, certas atuações pessoais que anteciparam a performance, a poesia, a crítica e a teoria estética, o vídeo, as artes plásticas, o teatro, etc.

O período de maior prestígio do Fluxus aconteceu entre 1963 e 1969. Durante a turbulência política de 1968 a 1973, o movimento decaiu ostensivamente na Europa e nos Estados Unidos, florescendo novamente em 1973, quando alguns artistas desligados do grupo, voltaram a se reunir, mas sem a mesma intensidade artística .

O movimento Fluxus, uma espécie de Dada dos anos 60, representou um momento decisivo da Arte de vanguarda, militando em todos os setores da criação artística. Teve sua pré-história (ainda nos anos 50), pautada na música experimental e poesia concreta e uma pós-história no Minimalismo, Arte Conceitual, e na Performance, ocorridos entre os anos 60 e 70.

Fluxus, um movimento de delimitação geográfica nada fácil, foi internacional. Nunca chegou perto de se tornar uma "escola". Em seu livro, Andreas Huyssen faz referências ao Fluxus, mostrando algumas visões sobre este movimento:

Pode-se ser tentado a dizer que Fluxus não é, nem nunca foi, um movimento artístico, no sentido tradicional. De algum modo ele falhou, mas seu fracasso real foi transformado num sucesso de quase mítica proporção. Pois se o pior que pode acontecer a uma vanguarda é ser cooptada, colecionada e "museificada", então Fluxus (até recentemente) foi um retumbante sucesso exatamente porque, distinto do Pop Art, falhou em ser bem sucedido. Fora do círculo de um pequeno número de aficcionados, pode-se dizer que ele inclusive praticamente se esforçou para ser esquecido, um fato que garantiu sua longa permanência nas práticas artísticas e que explica a excitação pela sua redescoberta atual.

De modo recíproco, se o melhor que pode acontecer a uma vanguarda é que ela crie uma tradição vital enquanto escapa ao destino de uma ossificação dogmática, então Fluxus foi extremamente bem-sucedido, já que muitos de seus antigos praticantes embarcaram em novos projetos nele inspirados, e já que deixou traços significativos em muitas práticas subseqüentes, tanto quanto no trabalho de vários artistas individualmente. Alguns declararam inclusive que nenhum dos movimentos artísticos dos anos 60 e 70 teria sido possível sem a fagulha inicial de Fluxus. Mas se alguém relaciona certo artista ou certo trabalho a Fluxus, então padrões de pureza e exclusão estão sendo usados pelos primeiros participantes do movimento, tornando o fenômeno muito difícil de definir. Dick Higgins listou nove critérios para os trabalhos Fluxus, que são tão amplos a ponto de incluir praticamente (ou, no caso, excluir) tudo o que é pós - moderno sob o sol, dependendo de como se interpretam esses critérios. Já Robert Watts cinicamente sugeriu que "a coisa mais importante sobre Fluxus é que ninguém sabe o que ele é". Mas, visto desse modo, Fluxus pode ser tanto o código oficial do pós - modernismo como o último movimento de arte não figurativa – ou seja, o sublime do pós - modernismo. Nenhuma destas duas visões é realmente satisfatória.


 

Hoje, Fluxus está sendo redescoberto, está sendo colecionado e validado como uma vanguarda, tornando-se, cada vez mais, um sucesso em termos de mercado e de museu.

O momento genuinamente Dadaísta em Fluxus é o projeto de acabar com a Arte. Fluxus, como neo Dada, tinha sua própria lógica e não permitia a destruição final da Arte, uma contradição performática que não parecia aborrecer ninguém naquele tempo.

Inovador em mudanças na Arte, seu reconhecimento como movimento artístico foi muito tardiamente reconhecido. É que, diferente da Pop Art, do Minimalismo ou da Arte Conceitual, Fluxus não tinha interesse em "aparecer"; ao contrário, fez um enorme esforço para ser esquecido, não só como um movimento, mas também como uma tendência ou atitude. Poucos relatos históricos sobre a arte dos anos 60 têm muito a dizer sobre o movimento.

E, apesar disso, a partir do momento em que se estuda Fluxus como fenômeno do final dos anos 50 e início dos 60, observam-se traços Fluxus em vários movimentos artísticos que o seguiram nos anos 60 e 70, como o Minimalismo, a Arte Conceitual, a Performance, e as expressões da Vídeo Art, Mail Art e Correspondence Art.


 


 


 


 


 


 


 

3.3- A antiarte da Arte Autodestrutiva


 

Ao se basear na destruição como elemento crucial da Arte do século XX, Gustav Metzger criou um movimento artístico, de uma pessoa só, que intitulou Arte Autodestrutiva.

    Em 1957 eu já estava muito insatisfeito com os materiais de pintura. Precisava de algo mais duro para trabalhar na tela. No ano seguinte, fiz uma série de quadros em aço leve. Usei uma faca de palheta que durante a aplicação da tinta riscava e afundava o aço, fazendo reflexos. Isso também não me satisfez. Eu queria usar algumas máquinas descritas no Financial Times. Prensas de tremenda pressão por polegada, que reagem a uma fração de minuto. Queria fazer esculturas com essas máquinas, controlando-as como um organismo controla seu instrumento. Foi meses depois de desistir desses planos, parcialmente por causa da extrema dificuldade de realizá-los, que cheguei à idéia de arte autodestrutiva.

Revendo o meu desenvolvimento, percebo que havia esgotado a mídia de pintura em telas, no sentido da expressão de uma visão rápida e intensa. Em 1960, com a técnica de ácido em náilon, acabei descobrindo essa expressão.


 

O primeiro manifesto dessa nova forma de Arte, que na realidade nunca chegou a existir, foi assim explicado:


 

A Arte Autodestrutiva é essencialmente uma forma de arte pública para sociedades industriais.

A pintura, a escultura e a construção autodestrutivas são a união total da idéia, lugar, forma, cor, método e tempo do processo de desintegração.

A Arte Autodestrutiva pode ser criada com forças naturais, técnicas tradicionais de arte e técnicas tecnológicas.

O som amplificado do processo autodestrutivo pode ser um elemento da concepção total.

O artista pode ter a colaboração de cientistas, engenheiros.

A Arte Autodestrutiva pode ser produzida por máquinas e montada em fábricas.

As pinturas, esculturas e construções autodestrutivas têm um tempo de vida que pode variar de alguns momentos a vinte anos. Quando o processo de desintegração estiver concluído, o trabalho deve ser removido do local de exibição e descartado.


 

Nesta declaração, Metzger lançou a plataforma de AAD ( Arte Autodestrutiva ). Mais tarde, lançaria outros quatro manifestos, mas não conseguiu nenhum adepto, já que os artistas preferiam juntar-se aos grupos dos Novos Realistas e Fluxus.

Em se opondo ao sistema do mercado de Arte, Metzger propôs uma Arte, em que pinturas, esculturas e construções, tivessem um tempo de existência. Não fazia segredos das técnicas usadas nos trabalhos, descrevendo-as minuciosamente, para que as pessoas entendessem todo o processo criativo da Arte Autodestrutiva.

Em 1962, escreveu o Manifesto World, no qual taxava os donos de galerias de "malditos bastardos fedidos fumantes de charuto".
Nos anos 70, propôs uma greve artística que duraria três anos, de 1977 a 1980. Durante esse período, os artistas ou não produziriam, ou não venderiam ou não permitiriam que trabalhos fossem exibidos, e negariam colaboração com qualquer parte da máquina de publicidade do mundo artístico. Esse protesto, é claro, foi um fracasso, já que Metzger foi o único artista a aderir à greve e o mundo das artes, ao contrário do que ele desejava, não foi destruído.

Como os Dadaístas, Metzger era muito criativo e transpunha, em sua ideologia, uma antiarte caracteristicamente Dada.


 


 

3.4- Dada e os neo Dada


 

    Na tentativa de eliminar a personalização e o consumismo, surgiu o Minimalismo, criado por escultores americanos que assim se definiram, reagindo à presunção do Expressionismo Abstrato e à vulgaridade da Pop Art.

Para esses escultores, a forma mínima garantia a intensidade máxima.

Alguns críticos, remetiam o Minimalismo ao readymade de Duchamp que, na simplicidade do objeto, minimizou seu aspecto, tornando-o limpo, nu, simples. No Minimalismo, com suas formas mecânicas frias, o espectador fazia delas o que os artistas fariam.

    Ao final dos anos 60, na opinião de um grupo de artistas chamados Conceituais, o mundo da arte proclamava a "morte da pintura", não só da pintura mas também da escultura.

Os Minimalistas varreram, da arte, a imagem, a personalidade, a emoção, a mensagem e a produção manual.

Os conceitualistas deram um passo além e eliminaram o objeto. "A própria idéia, mesmo se não é tornada visual, é uma obra de arte tanto quanto qualquer produto", disse o escultor Sol Le Witt, que deu o nome a esse movimento.

    Vários outros movimentos foram influenciados por Dada, de tal forma que alguns diziam que a arte não é a mesma a partir de Dada. Nos Happenings, nos remetemos aos saraus Dada. A Body Ar, nos leva ao Dadaísta Arthur Cravan. Também tiveram influências os artistas Performáticos, a Arte Conceitual, o Concretismo, o Construtivismo, a Assemblage, dentre outros.

Ainda que escritores afirmem que determinados movimentos não tiveram nada a ver com Dada, observamos que, na maioria destes, há uma semelhança com o Dadaísmo, seja na representação artística, seja na idéia de grupo, nos questionamentos tão parecidos com aqueles dadaístas, mesmo que em épocas diferentes.

4- O CONTEMPORÂNEO E DADA


 

"A mente é que faz o artista".

Marcel Duchamp


 


 

Marcel Duchamp é considerado, por muitos, "o artista do século". Sem dúvida, foi um grande questionador dos critérios e julgamentos sobre arte. Sua ousadia de inscrever um mictório numa exposição em 1917 e de colocar um bigode na Mona Lisa, marcou profundamente o início de transformação pela qual a arte passou no século XX.

Duchamp desejava mostrar ao público que arte é aquilo que o artista vê como arte, e que aparentemente, qualquer coisa poderá ser arte, dependendo da pessoa que a designe. Com isso, revolucionou o pensamento artístico de nossos tempos, "bagunçou" os museus que expõem um mictório, uma roda de bicicleta e nos fez ter uma nova percepção da arte.

Ao escolher um objeto de produção em massa e enviá-lo para exibições de arte, Duchamp negou a categoria de produção individual do artista. A assinatura era arbitrária porque todas as reclamações para a criatividade individual foram zombadas, gozadas, falsificadas. A provocação de Duchamp não somente desmascarou o mercado das artes, mas também questionou, radicalmente, o princípio da arte e da sociedade burguesa, na qual o indivíduo era considerado o criador do trabalho de arte. Os readymade de Duchamp não eram trabalhos de arte. Porém, eram manifestações.

Hoje, podemos considerar que existe uma arte antes de Duchamp e outra após Duchamp.

Esta entrevista a seguir, observaremos um pouco do que Duchamp pensava no final de sua vida. A entrevista foi realizada pelo crítico de arte americano John Perreault, provavelmente em 1968 e transposta para a Internet em 1996.


 

Jonh Perreault: Já faz algum tempo, desde que tivemos nossa última conversa, a qual foi muito significante para mim. Muita coisa aconteceu depois que eu o encontrei.

Marcel Duchamp: Poderíamos deixar algumas pessoas encabuladas, eu lhe falaria que o que acontece comigo é o que acontece com todo mundo.

JP: Eu me lembro quando o encontrei pela primeira vez, no começo de minha carreira de crítico de Arte, que coincidiu com o fim da minha carreira de artista e poeta. Você, na época, insistiu que o verdadeiro artista não teria chance de sê-lo, a não ser se fosse undergrond. Agora, você está realmente undergrond.

MD: Isto é muito divertido.

JP: Não tão divertido como seu último trabalho Given: 1-the waterfall 2- the lighting gas. Muito poucos sabiam do trabalho, até ser exposto no Museu de Arte da Filadélfia no meio de outras magistrais obras.

MD: Meu presente para o mundo da Arte.

JP: Por que você o manteve em segredo?

MD: Como já falávamos no passado, segredos são essenciais no meu trabalho, o qual pode ter ou não ter alguma coisa ligada à arte.

JP: Eu li sua nova biografia, escrita por Calvin Tomkin's, chamada simplesmente, Duchamp, na qual seu cunhado Jean Crotti disse que você usa seu tempo livre para fazer realmente trabalho de arte.

MD: Sim, é como eu uso o meu tempo livre.

JP: Para mim, a sua maior contribuição tem sido seu segredo e isso inspirou meus próprios trabalhos de Arte em segredo. Eu diria que o segredo é, certamente, o tema do seu trabalho.

Eu penso no readymade de 1916 – With a Hidden Noise – no qual há uma bola de barbante com alguma coisa por dentro que, quando você sacode, faz barulho.

Acho magnífico Given Itself em que buracos nos mostram uma queda d'gua. Porém tudo foi mantido em segredo enquanto você trabalhava nele, de 1946 a 1966. Depois, finalmente, foi revelado.

Também apontei, alguns anos atrás, sua produção depois de Bride Stripped Bare..., a partir da qual, supomos que você abandonou a arte pelo xadrez e o retrospecto foi provado não ser significante. Agora quando você olha para o trabalho, Dada Invades New York, dá-nos a impressão de que você está muito ocupado com as partidas de xadrez. Sabemos que o trabalho sempre esteve lá porém invisível, algo como uma carta que contém uma pequena história famosa escondida, mas numa luz visível.

MD: Eu sempre me mantive ocupado, mentalmente falando.

JP: Essa atitude mental era Arte?

MD: Depois de um certo ponto, eu perdi interesse de fazer objetos ou figuras para vender. Se você retira o comércio, os críticos, as campanhas artísticas, podemos dizer que alguma coisa feita lá atrás pode ser Arte ou alguma outra coisa.

JP: O que é essa alguma coisa a mais? Uma idéia?

MD: Não. Não é uma idéia. É um rumor, um perfume.

JP: Sim, um perfume. Uma vez você me disse que a Arte tem um cheiro que só dura 30 anos e na entrevista que eu publiquei na East Village Other em 1965, coloquei aspas quando você disse que a Arte deixa um cheiro para trás, mesmo que seja removida para um outro quarto, um outro estado, um outro país.

Falando em contradições, em sua recente exposição no Whitney, traz de volta memórias? Todos seus amigos do período Dadá de Nova York estão lá. O Countess, Man Ray, Beatrice Wood. Há alguma arte cênica ao deixar nos objetos desenhos, pinturas, livros?

MD: Em minha opinião, em nenhum deles há arte cênica. Todo aquele trabalho está morto. Ele deve ter passado dos 30 anos. Toda energia foi sugada do trabalho. Quando fui ver a exposição, a sensação que me deu foi a de que eu estava olhando para um trabalho encontrado numa tumba Egípcia.

JP: Eu tive uma experiência diferente. A maioria dos trabalhos importantes está sempre em apresentação no museu de arte da Filadélfia durante todo tempo. No todo, penso que o show é imperdível. Vale a pena se pagar uma passagem para ir à Filadélfia só para ver seus trabalhos.

MD: Muito bem colocado.

JP: Sim. Incluindo as setes pinturas de seu amigo John Covert, particularmente aquela em que há uma maçã cortada pela metade e a pequena coleção de coisas da baronesa Elsa Von Feytag-Loringhoven, o que me motivou a procurar alguns de seus poemas.

MD: A baronesa foi uma inspiração para todos nós. Ela, absolutamente não tinha medo. Seus costumes eram sua arte e eu gostei da maneira como ela caçava e torturava o pobre William Carlos Williams que, de alguma forma, transformou-se em objeto da luxúria dela. Você já havia visto a arte de Covert ?

JP: Não que eu me lembre.

MD: Isto explica porque todos estão vivos para você! Não viu muitos dos meus trabalhos, o público ainda não drenou completamente a energia deles. Isto explica o perfume que existe nos dias de hoje. Também estou certo de que você tentou adivinhar, agora, que o perfume da Arte algumas vezes está no nariz do cheirador.

JP: Isto é verdade. Eu também gosto da arquitetura do apartamento Arensberg onde tantos salões existem, entretanto, nunca estive lá.

MD: Eu o achei sufocante, mas negócio é negócio. Deixa estar.

JP: Posso ousar ser mais pessoal?

MD: Eu odeio ser pessoal, mas como tenho grande admiração por sua crítica de arte, eu farei o melhor possível.

JP: Essa é uma pergunta perigosa. Por que você casou-se com Lydie Sarazin-Levassor? Eu li isso na sua biografia feito pelo Calvin Tomkin's. Eu posso entender o seu relacionamento com Mary Reynolds e, depois, seu casamento com Teenie, porém Lydia, com quem você se casou em 1927, parece totalmente fora de propósito! Ela era muito gorda, não se interessava por Arte, mesmo sendo muito rica.

MD: Na época, eu fiquei satisfeito, mas ela não era tão rica como pensei. Casei-me com ela, porque ela era indiferente à Arte. O casamento foi como um trabalho de Arte, um Happening, uma performance, muito além do normal para aquele tempo. Depois de minha obra prima chamada The Bride Stripped Bare by Bachelors, Evem, o meu casamento estendeu aquele tema.

JP: Minha próxima pergunta pessoal é sobre dinheiro. Sei que você mantém suas despesas, ao mínimo possível. É verdade que você se tornou uma espécie de "marchand" de arte privada?

MD: Nós temos que fazer alguma coisa para sobreviver; as esculturas de Brancuse estavam espalhadas; algumas aqui, outras ali. Porém gostaria de lembrar que, por um longo tempo, eu ganhei algum dinheiro dando aulas de francês.

JP: E a exibição de Whitney? É correta para o período?

MD: Não devo julgar, mas, para mim é uma coleção de fantasmas, cadáveres dentro de uma geladeira no necrotério, carnes mortas.

JP: Há Dadá agora?

MD: O Dadá que nós tentamos criar não apareceu até agora; não existe. Provavelmente não virá como existência unida. A exposição não é Dadá. O trabalho de Tomkin definitivamente não é Dadá. Seria melhor que ele tivesse mostrado um outro tipo de piso, trazendo uma arte nova, arte com alguma surpresa.

JP: A exposição é educacional., Ela representa um período selvagem da Arte americana. Eu não estou certo da teoria de Naumann em que o Dadá de Nova York é oposto ao Dadá europeu, mais humorístico. O Tomkin aponta a palavra francesa que freqüentemente você usa, e cuja tradução é "mente". Numa famosa frase, você dizia que queria colocar a pintura a serviço da mente. Tomkin acha que talvez signifique espírito, alma, caráter, inteligência.

MD: Ele está certo.

JP: A exibição, inadivertidamente, confirma a sua regra como um cataclisma. Porém, além da moldura do tempo da exibição, há um consenso: sem você e sem Dadá não haveria Pop Arte, Arte Conceitual e Arte Pós-Moderna.

MD: Não tenho nenhuma responsabilidade quanto a isto.

JP: Você tem visto alguma nova arte de que você goste?

MD: Não estou observando o que anda acontecendo por aí.

JP: Posso recomendar alguma exposição?

MD: Certamente. Estou sempre interessado pelo que os outros artistas estão fazendo, principalmente quando eles estão seguindo as minhas idéias.

JP: Ontem quando eu estava abrindo minha correspondência, percebi um poster grande, que parecia ser a sua fonte, o urinol que você fez em 1917. O poster dizia: Duchamp, e o endereço ficava bem perto de onde você mora. Fiquei pensando...

MD: E ?

JP: É um idéia brilhante. Uma loja pintada de branco e na janela um candelabro. Havia uma espécie de igreja com a sua Mona Lisa em cima. Mais adiante, estavam a fonte, a garrafa e algo não terminado. Havia também uma porta de duas bandas, onde aparecia Paris. No fim, havia outra porta aberta, revelando um banheiro. A galeria estava fechada, mas, felizmente vi luz saindo de um porão aberto. Estava no início da noite. Caminhei para baixo das escadas e, dentro, estavam um homem e três mulheres sentadas em volta. As paredes estavam cobertas com desenhos da fonte. Eu fui reconhecido. O homem disse-me que havia um poeta, em Nova Jérsei, usando meu nome, ou alguma coisa bem próxima disso.

MD: Não me diga! O homem do porão é o famoso Mike Bidio, que tem feito as pinturas de Jackson Pollock, copiou tudo exatamente, incluindo Andy Warhol.

JP: É o seu melhor show. O nome dele não está nem nos anúncios com risco de adicionar infúrias, nessa brincadeira aí. Eu gostaria de acrescentar que muitos dos seus 16 objetos, na Whitney são réplicas, reproduções, reconstruções ou lições recentes. O Duchamp por Bidio deve ser visto como as réplicas das réplicas.

MD: Bem, eu sempre disse que um readymade tem que consistir de alguma coisa e nenhum valor estético, o que é certamente verdade no meu readymade. Penso que o amigo Bidio está por dentro dos acontecimentos.

JP: Você ainda está fazendo Arte?

MD: É um dos meus maus hábitos. Estou certo de que haverá mais trabalhos póstumos aparecendo.

JP: Finalmente, desde que a exposição Whitney fora o Dadá de Nova York, o que Nova York significa para você e seus amigos artistas?

MD: Liberdade.

JP: O que Dadá significa?

MD: Liberdade.

    
 

    

    Duchamp revolucionou a Arte ao expor seu urinol e nos impôs a observação de algo tão antagônico como Arte. Isto nos estarreceu por várias décadas. O urinol que, a princípio, não representaria nada, além de um escandaloso troféu na tentativa de provocar reações com relação ao objeto, mudou o pensamento artístico deste final de século.

Poderíamos dizer que a Arte não foi mais a mesma depois do urinol. Antes havia uma Arte que precisava ser sacudida de alguma maneira; depois, uma arte já sacudida, preparada para reflexões.

Menezes faz sua análise sobre o urinol, de uma maneira bastante significativa e sintetiza seu pensamento sobre Arte de um modo bem interessante.


 

" ... Ao enviar sua Fonte ( urinol ) para uma exposição, Duchamp acabou provocando a ruptura definitiva que marca, a nosso ver, a entrada em uma nova época, a nossa modernidade visual. Esse ato, aparentemente desconexo, é pleno de significados. O fato da obra, por acaso, acabar não sendo exposta, não altera em nada nosso raciocínio. O ato de Duchamp aprofunda essa percepção. O múltiplo, que antes se referia apenas a formas de abordagens diferenciadas, em relação à constituição de objeto plástico - multiplicidades possíveis de regras -, agora se transforma, nessa escolha ao acaso do objeto e em sua aceitação oficial, que o transmuta em obra de arte, na instauração da ausência de qualquer possibilidade de definição. Após essa "obra", o que está em jogo não é mais nem a obra, nem mesmo o processo artístico. É o próprio ato. E, se a arte é um ato, nada mais pode definir o que é arte. O que começou como destruição do próprio objeto de arte. A nosso ver, é nesse momento crucial que se instaura uma modernidade nas artes plásticas. Definida, se quiserem, por uma negação. O ato de Duchamp transforma qualquer objeto em objeto artístico. Ele vai depender apenas de uma escolha. E também vai pôr em xeque o último ponto que nos interessa ressaltar, a questão da relação entre arte e mercadoria. Põe em evidência, mas não a resolve, pois a arte tornou-se uma instituição que o mercado se esforçará sempre para controlar. A arte agora pode ser questionada em todos os seus fundamentos sem se destruir. E isso, na época, era novo. E é isso que permite o culto do novo na arte moderna, seu conteúdo mercadológico mais evidente. E vimos, no decorrer deste século, como alerta de Duchamp, por mais percebido que tenha sido, não conseguiu resolver o problema crucial que é fugir desse mercado. A tarefa é mais simples do que parece, pois, na verdade, escapa totalmente às artes essa possibilidade. O embate das artes se dá em outra dimensão no real, e ela percebeu, como vimos no manifesto de Breton, sua importância para invadir e destruir os espaços do mercado e da política. Reconhecendo-se em seu campo, ela tem mais o que fazer do que tentar resolver o que lhe escapa. Os dadaístas só reforçaram essa perspectiva que, desde 1913, Duchamp já havia deixado claro. A arte volta a lutar contra valores ultrapassados e é esse seu campo de batalha. Sua briga é no espaço, no campo do pensamento visual, e foi ( creio ainda ser ) duro para alguns reconhecer essa limitação. Mas é justamente aí, nesse lugar, que a sua luta é importante: no questionamento do pensamento plástico, dos valores que o constituem, dimensão que é do pensamento social. Não se deve esperar da arte o que ela não pode nos dar, pois como diz Thomas Mann em sua Montanha Mágica, " As contradições podem reconciliar-se. Somente o meio termo e a mediocridade são irreconciliáveis".


 

Quando surgem mudanças, por algum tempo, há sempre confusão. Isto acontece em qualquer área de conhecimento. As pessoas precisam de um tempo para entender as idéias expostas e o que a princípio, choca, aos poucos, vai sendo assimilado podendo ser apreciadas ou não.

Aparentemente, qualquer coisa pós "urinol" poderá se intitular de Arte, mas o que parece ter acontecido foi um rigor maior no objeto artístico.

É bem verdade que o artista, hoje, é um ser solitário e, nessa solidão, procura ser original, numa sociedade a qual afirma que a originalidade não existe mais e que tudo o que deveria ser feito em relação à arte já foi feito.

As pessoas que afirmam isso provavelmente têm razão. O próprio Duchamp não teve originalidade ao expor seu mictório; o que ele teve foi uma enorme coragem, ao expor algo que, aparentemente, é uma aberração. O seu primeiro readymade, Roda de Bicicleta, se compararmos à alavanca de roda, que utilizavam na época verificaremos que, a semelhança entre ambos salta aos olhos imediatamente. Os seus trabalhos, que não foram muitos, pelo tempo que viveu, acabam sempre repetindo-se de algum modo. Utiliza a mesma idéia para produzir outros trabalhos, o que não deixa de ser original.

A arte de Duchamp ficou famosa pela visão de futuro. Foi um artista moderno na medida em que aceitou especializar-se em uma idéia conceitual da Arte, objetual da arte.

Nossa sociedade é dinâmica, instável e evolutiva. A Arte dá significado à vida, no sentido de reconciliar o homem com seu destino, que é a morte. Não a morte no sentido simplesmente físico, mas aquela morte que é a indiferença, a "accidie" espiritual.

Neste sentido, a Arte compromete-se com a ilusão e a maior ilusão é a busca da razão e da claridade, para uma resolução no mito ontológico do paradoxo da existência.

Quando o artista faz um trabalho e o apresenta explicando "isto é uma bela paisagem", na verdade ele está nos apresentando algo que não existe, que é uma visão da mente.

O artista não pode deixar de indicar, de modo algum, que isso é exatamente o que é, um "construto", uma ilusão. Ou seja, uma visão da mente que pode se projetar em perspectiva de maneiras sutis que interferem no simples prazer que pode existir em o observador sonhar com tais coisas.

Hoje, os dadaístas não seriam considerados tão loucos como em sua época. Nosso século, presenciou mais de 100 guerras e, da revolta em relação à Primeira Guerra Mundial, nasceu e morreu o Dadaísmo.

Atualmente, existem, no mundo, pelo menos 36 guerras em andamento. Para alguns críticos, a Arte apresenta um diagnóstico desfavorável como talvez, nunca tenha antes visto. Entretanto também nunca se fez e se falou tanto sobre Arte. Ela nunca foi tão vista e tão divulgada. Dada foi muito importante para tudo o que acontece hoje. Na sua antiarte, anunciando a morte da Arte, Dada não fez mais do que tornar a Arte mais viva, criando um novo pensamento artístico, uma nova Arte.

O homem tem, como necessidade mais arraigado a liberdade. O termo liberdade significa a condição do indivíduo não ser submetido ao domínio de outro e, por isso mesmo, ter poder sobre seus atos.

A capacidade de raciocinar e a de valorizar, de forma inteligente, o mundo que o rodeia é o que confere ao homem o sentido da liberdade, entendida como expressão da vontade humana.

É claro que não vamos fazer nenhuma análise sociológica ou mesmo filosófica sobre a liberdade. Não interessam os tipos de liberdade, quem merece ter liberdade etc. A liberdade enfocada é esta que a sociedade nos permite ter e sermos aceitos como um ser dentro do contexto social.

Na Arte deste final de século, a liberdade é o principal recurso que o artista tem. Liberdade para fazer toda espécie de trabalho que sua mente permitir.

A recente exposição Sensation, realizada no Brooklyn Museum of Art, em 1999, pode servir como um bom parâmetro para analisarmos a que ponto a liberdade de expressão chegou nos dias de hoje.

Num conjunto de trabalhos que geraram escândalo, destacou-se o polêmico trabalho intitulado The Holy Virgin Mary, de Chris Ofili, um jovem artista britânico. Nesta obra, na Virgem Maria aparecem bolotas de esterco de elefante aplicadas sobre o seio esquerdo e recortes de revistas pornográficas ao redor. Seria esta uma atitude Dada?

É claro que é uma obra ofensiva ao símbolo católico, mas, tirando o sentido religioso, observamos sua elaboração a partir de um mosaico de pontos coloridos, com ênfase no dourado, lembrando muito iconografias religiosas bizantinas.

A imagem, da tela, Maria, que possui traços negróides, paira sobre fotos pornográficas como se fosse superior a elas.

O inglês Ofili é filho de imigrantes do Zimbábue e é também católico. O esterco de elefante é tido como sagrado na África. A tela denota reverência, não blasfêmia. Na indignação de algumas pessoas, foi questionada a Virgem Maria, mas, em nenhum momento se questionou o esterco de elefante sagrado da África. Puramente cultural, essa mentalidade. A intenção da exposição é chocar, já que, na publicidade, o museu usou como slogan: "O conteúdo desta exposição pode causar choque, vômito, confusão, pânico, euforia e ansiedade".

Muito se comentou a respeito desta exposição. Jornais e revistas indignaram-se a respeito da Virgem, mas o que houve mesmo foi um grande jogo de "marketing". A princípio a Liga Católica para Direitos Civis e Religiosos pediu boicote a "Sensation".

No dia seguinte, o prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani viu o catálogo da exposição e disse que "The Holy Virgin Mary" , de Chris Ofili, era ofensiva à religião católica. Ele ameaçou cortar os subsídios ao Brooklyn Museum (um terço do orçamento do museu). Alguns dias depois, o mesmo prefeito disse que a proposta da instituição de só admitir menores de 17 anos acompanhados por adultos violava os termos do contrato de aluguel e ameaçou despejar a instituição.

Na imprensa americana, analistas disseram que a postura de Giuliani pode ter como alvo os votos dos conservadores na disputa pelo senado contra Hillary Clinton. O museu entrou com processo na Corte Federal dos EUA, acusando o prefeito de violação da Primeira Emenda da Constituição Americana, que defende a liberdade de expressão.

No dia seguinte, a prefeitura entrou com processo na Suprema Corte do Estado, acusando o museu de conspirar com o dono da coleção privada, o publicitário britânico Charles Saatchi, e a casa de leilões Christie's para aumentar o valor das obras.

O diretor do museu disse que o processo era "ridículo" e que as obras não seriam postas à venda, já tendo exposições marcadas em outros países.

Como observamos, o escândalo foi muito mais político que qualquer outra coisa. Nada nos chocou mais e as surpresas que anteriormente eram criadas por alguns movimentos artísticos, talvez não nos surpreendam nos dias de hoje.

Em 1972, o artista Vito Acconci masturbou-se durante seis horas debaixo de uma rampa na galeria Sonnabend, na obra que intitulou Canteiro, transmitindo seus gemidos e murmúrios por alto falantes.

Esta atitude bem Dadaísta, não causou grandes polêmicas; mas o espanto de alguns que não entendiam o que acontecia.

Tentar escandalizar com cenas de sexo, também não impressiona mais. Talvez devido a Nijinsky que, em 1912, masturbou-se em pleno palco, no ballet L'Aprés-mide d'un faune, horrorizando toda a platéia naquele ato tão instintivo que, num clímax da dança, segundo Nijinsky, nem percebeu o que fez. Foi muito vaiado, mas sua dança tão primorosa não se abateu por este detalhe tão chocante para a época.

Uma atitude que poderíamos considerar como Dadaísta foi realizada pelo polêmico artista brasileiro Flávio de Carvalho, que utilizava a provocação como um ato poético subversivo. O artista retratava os últimos momentos de vida de sua mãe, Ophélia Crissiuma de Carvalho, no trabalho intitulado "Série Trágica", causando um grande escândalo, dividindo as opiniões dos intelectuais que o acusavam e dos que defendiam a iniciativa insólita do artista.

Retratar sua própria mãe, em sua fase terminal, realmente foi bem polêmico, pois mexeu com os sentimentos das pessoas, no sentido mais íntimo, que é o do final da existência de um ser e, sendo este sua própria mãe, isto se fortaleceu mais.

Flávio de Carvalho foi dramaturgo, cenógrafo, figurinista, arquiteto, pintor, desenhista, crítico. Tinha o espírito sempre aberto para todas as inovações do século XX. Para ele, o que contava era a experiência realizada, não relevando se desse certo ou não; o resultado final da experiência era o que valia.

Em 1931, percorreu a procissão de Corpus Christi em sentido contrário, de chapéu na cabeça para ver o que acontecia. O resultado foi que teve que subir num telhado para escapar do linchamento proposto pelo povo.

O artista plástico chileno Marco Evaristti, radicado na Dinamarca, voltou ao seu país, em maio de 2000, com uma exposição que causou enorme polêmica, particularmente entre seus colegas artistas. Ele criou uma instalação com 8 liqüidificadores cheios de água e com peixinhos nadando; caberia ao observador acionar ou não o motor. Evaristti afirma que sua intenção neste trabalho é fazer as pessoas refletirem sobre as responsabilidades diante da vida. Mas vários artistas locais, invadiram o MAM de Santiago em protesto, desligando as tomadas dos liqüidificadores e nomeando o colega de nazista da ecologia.

Interessante nesse caso, é que os próprios artistas rebelaram-se com uma atitude polêmica, interferindo na obra de Evaristti, que tem todo o direito de expressar-se da maneira que desejar, mesmo estando possivelmente ecologicamente incorreto.

Nesses anos 90, os artistas nunca levantaram "slogan", nem fizeram defesas apaixonadas desta ou daquela técnica. A Arte, hoje, tem como uma das características um certo niilismo irônico em tudo e a crença de que já não é possível fazer uma grande revolução, embora seja absolutamente possível fazer pequenas revoluções. Há um apego à experimentação e à presença da autobiografia misturadas a elementos de cultura popular, como acontece, atualmente no Brasil, com a geração 90. Há ainda uma crítica agridoce à realidade social, banindo as fronteiras entre pintura, escultura e instalação.

 

5- CONCLUSÃO


 

    Tentar comunicar-se onde nenhuma comunicação se fazia possível, era um pensamento que se fortalecia desde o final do século XIX. Podemos destacar como exemplo a peça escrita por Alfred Jarry, em 1896, Ubu-roi, que antecipou o teatro do absurdo e vários movimentos literários surgidos durante o século XX.

O dramaturgo brasileiro Qorpo-Santo (José Joaquim de Campos Leão), também foi outro exemplo. Autor de comédias escritas em sua maior parte em 1866, nas quais o monsense era levado às últimas conseqüências, e considerado, por alguns críticos, o precursor do teatro do absurdo, dramaturgia esta que propôs o rompimento com as estruturas lógicas do diálogo.

    Assim como na Literatura e no Teatro, nas Artes Plásticas também havia interesse em se criar uma nova arte que despojasse os burgueses e retratasse um novo tempo em busca de algo que sobressaísse e causasse algum impacto.

Hoje, a todo momento, comenta-se que não há mais nada a fazer na Arte: tudo já foi feito, e só há veios para a releitura, já que a Arte está morta e enterrada.

Sabemos que há mais interesse em sua morte, do que na sua existência plena. Por quê? Talvez não tenhamos respostas imediatas para esta questão ou, talvez seja mais interessante, mais conveniente e talvez cause uma polêmica maior dizer que a arte morreu.

Aceitaremos a morte da Arte? Ela teve seus momentos de glória e hoje está aparentemente "apagada". Conseguimos chocar alguém hoje em dia? Já tivemos, agressões, convulsões, devaneios, "pia fraus", surtos, todo tipo de imagens agressivas propostas para chocar intencionalmente as pessoas. Será que a Arte de hoje se resume a só isso: chocar?

A Internet está aí, forte, poderosa, dando-nos todo tipo de informação e tentando chocar com alguns sites produzidos especialmente para isso. Provavelmente poucas pessoas se chocarão com o que for visto. Ficarão impressionadas por algumas horas, mas depois nem se lembrarão do ocorrido. Por quê? Já não nos chocamos com "pouca" coisa, precisamos de algo maior, pior do que tudo que já nos foi oferecido. Precisamos? Existe?

Fazer Arte é um ato de coragem. Todos se julgam conhecedores de Arte. Se fazemos um trabalho, ele logo é criticado, analisado, e tachado de bom ou de ruim. Isto é um fato. Todos têm algo a dizer, são "mestres" em Arte.

Não percebemos um filósofo, por exemplo, permitir isso; as pessoas, geralmente, "respeitam-no", pois filosofia é difícil, incompreensível para um simples mortal. Arte não, é fácil, qualquer um faz. Isto é o que geralmente se passa. Esses rabiscos? Ah!... sou capaz de fazer.

Dada ajudou nessa concepção. Ao fazer seus poemas sonoros, autorizou a qualquer pessoa ser poeta; ao fazer suas colagens, suas frotagens, assemblagens, autorizou a qualquer pessoa ser artista. É delírio? A desvalorização da arte provavelmente foi muito ajudada por Dada, ao mesmo tempo em que a valorização foi também muito ajudada por Dada. Loucura? Claro que não. Realidade. Dada possibilitou os extremos, a valorização e a desvalorização do que quer que fosse. Dada não se encaixou no meio termo dessa desvalorização e valorização da Arte.

Sem conseguir um equilíbrio, Dada se projetou para o mundo como um movimento revolucionário de destruição do próprio mundo. Ao se opor à guerra, projetou uma guerra pessoal contra a Arte, desfinalizando, assim, um momento, um tempo, em que pessoas ansiavam por acontecimentos que as tirassem das desgraças com que o mundo lhes presenteava.

Entender Dada. Não há como; ser Dada, todos somos; fazer Dada, todos podemos. Se não há mais nada o que fazer, para que fazer? Esta pergunta sempre será feita. Mas, a não verdade é que, por mais que a desejem, a Arte morreu.


 

 

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ANEXOS

1 comentários:

  1. nossa vc me ajudou muito,
    não é fácil encontrar trabalhos tao completos e claros na internet.
    eu achava q o meu estava melhor do que muitos por aí, mas quando li o seu vi que não a nem comparação.
    parabens e obrigado

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